“Alegria na longevidade”: servidora do TRT2 compartilha crônica sobre “estrada da vida”
As memórias de uma comemoração de aniversário inspiraram a crônica “Alegria na longevidade”, escrita pela servidora aposentada do TRT2, Maria Alice Gurgel do Amaral. Ela exerceu sua habilidade enquanto escritora para registrar o acontecimento do cotidiano e homenagear a mãe de sua amiga que conheceu no TRT2.
A escrita literária e técnica é uma das atividades realizadas pela servidora desde que se aposentou. De lá para cá, Maria Alice teve sua criação poética premiada no concurso “Poesia Livre”, em 2017, pela Editora Vivara. Além de se dedicar à poesia, é graduada em Direito e Jornalismo, tem doutorado pela Universidade de São Paulo (USP) e pós-doutorado pela Universidade de Sorbonne, na França.
Conheça um pouco mais sobre o processo de criação da servidora no perfil publicado no Espaço Cultural, no mês de maio de 2017. Para entrar em contato com Maria Alice, envie e-mail para alicespinelli46@gmail.com.
Confira a seguir a crônica “Alegria na longevidade” na íntegra.
ALEGRIA NA LONGEVIDADE
De Maria Alice Gurgel do Amaral
No final do filme “Van Gogh com Amor”, ouvi uma frase pronunciada pela personagem principal, tão maravilhosa e revolucionária, que o filme perdeu repentinamente o valor, e se impôs como a grande cena. Mas será mesmo verdade? Eis a frase:
“Quando se vive até a velhice, chega-se ANDANDO ATÉ AS ESTRELAS…”
Pois é, vejam: e é essa maravilha de estrada, que está sendo palmilhada por dona Zilda, 96 anos, muitos meses, semanas, dias, horas, minutos e segundos, de vida intensa, intensa vida – , de total alegria.
Ah! Dona Zilda… ainda brilham os olhos dela – lindos e bem abertos – , ao soprar as velinhas de 96 anos, diante de parentes vaidosos com a sua presença, e, junto a um enorme bolo de chocolate, cerejas e muito entusiasmo. A foto que clicamos de dona Zilda, recebendo o presente de que mais gostou, foi linda. Ela, simplesmente, adorou a écharpe de renda grise, e eu a ajudei a arrumar os bordados de fios de renda, que se desenhavam sobre ela, aumentando sua felicidade.
Preocupada em se apresentar ainda mais linda e elegante aos convidados do seu grande acontecimento – o niver de 96 -, apressou-se em buscar uma tesoura, para cortar as etiquetas, a fim de não macular a beleza, que então, passava a desfilar na sala.
Ela está sempre plácida e com sorriso discreto, mas intenso!
Não há tempo e nem peso no rosto de dona Zilda. Inexplicável: a vida não lhe abriu sulcos, fundos, profundos ou mesmo rasos. Evidente, que ela também passou por dificuldades: mas se levantou e se reinventou. Na verdade, – entendendo bem -, acho que, pela narrativa de sua história, que já se vai longe…, nem precisou levantar-se das situações difíceis, porque não se deixou cair. Seguiu e seguiu bem… e continua firme e tranquila, na realização desse caminho até as estrelas e felicidade de todos nós, que convivemos com ela.
Perguntada se estava feliz, ao comemorar os 96 anos tão bem, e já quase esbarrando nos 100, ela respondeu, meiga e sorridente: “Estou sim, mas sabe que não presto muita atenção se são 96… vou vivendo, sem prestar muita atenção”. Pois é…. ela se lembra apenas de viver e de ser feliz. (Diferente de muitas pessoas, que só se lamentam e reclamam de problemas de status, idade, doenças e riquezas, e se esquecem da VIDA, e de que deveriam gritar gratidão e alegria, somente por estarem vivos, antes de tudo…).
Dona Zilda me confidenciou, com preocupação, que, na última consulta com a médica geriatra, perguntou se os exercícios que vem fazendo, não estariam acima de sua capacidade e poderiam lhe causar algum mal: duas vezes pratica musculação, treinamentos de memória e outros mais … Ficou aliviada, quando a médica lhe orientou para manter todos os exercícios. Contou que sempre praticou atividade física e gosta muito.
Disse que foi muito feliz, em seu único casamento, e que o marido lhe fazia tudo. Quando ficou viúva, sentiu muito, e teve que reaprender a tomar providências essenciais, para manter a vida organizada. Isso porque parece que ela a “mimava”. Não usou exatamente essa expressão mas, pelo narrar dos fatos, era tratada como uma “princesa”. Mas foi à luta, quando precisou
Ela tem uma filha, Margarida, funcionária aposentada do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª região – São Paulo. E me falou que o nascimento de Margarida foi a emoção mais intensa e verdadeira, que viveu. Ao se referir à filha, os olhos extravasavam de felicidade, trazendo do passado, a mesma alegria que percorria o tempo, desde aquele momento, encontrando-se nesse presente, onde ainda continua firme e construtiva.
Quando a filha nasceu, e dona Zilda trabalhava como funcionária pública estadual, passou a morar com a sogra e a cunhada, com quem se dava perfeitamente bem. Foram anos de partilha da vida familiar e também das tarefas domésticas. Sempre recebeu muita ajuda e confessou: “nunca gostei de cozinhar”.
Quando se aposentou, ficou contente, mas procurou algumas atividades para complementar o uso do seu tempo então livre, e também ganhar alguns valores. Fazia, com excelência, e muito prazer, as letras góticas nos envelopes de convite de casamentos, formaturas e festas, em geral. “Ficavam lindos”, afirmou ela, e “faziam sucesso; assim, eu me distraía e ganhava algum dinheiro, para complementar aposentadoria e pensão do marido”.
Parece que dona Zilda continua fazendo sucesso. E agora ela passa a ser também modelo para todos nós. Nossos agradecimentos e nossa admiração.
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