Servidor publica romance e destina renda para erradicação da poliomelite
Sadi Pierozan, servidor do TRT4, dedica uma fração do dia, e às vezes da madrugada, à escrita literária, enquanto atua na Justiça do Trabalho. “Independentemente de qualquer coisa, acho importante não passar um dia sem escrever, ou pelo menos revisar o que escrevi. Se, em algum dia não puder escrever mais do que um parágrafo ou uma linha, que seja. Tento compensar aos finais de semana”, comenta sobre seu processo criativo.
Sadi escreve com essa frequência há cinco anos, tempo que levou para finalizar seu primeiro livro: “A Lei do Tempo”, um romance baseado no conto de mesmo nome que havia escrito ainda na adolescência.
“O despertar do escritor, digamos assim, ocorreu numa noite do rigoroso inverno gaúcho, de um vento minuano ferino e cortante, que estrilava nas frinchas das janelas. Nessa noite, depois de uns quatro pratos de sopa quente (não vai aí nenhum exagero), deitei logo em seguida e comecei a ler. Não demorou para que eu começasse a passar mal e a delirar. E nesse delírio veio-me a inspiração para transformar em romance um conto que havia escrito ainda na adolescência (virou o prólogo de “A Lei do Tempo”). Minha esposa insistia em me levar ao hospital, mas eu só queria saber de rabiscar, freneticamente, a arquitetura do meu futuro romance.”
Poliomelite
O livro de Sadi se tornou realidade após uma reunião em uma das unidades do Rotary Club, em Porto Alegre (RS), na qual o escritor deu um depoimento sobre a poliomelite.
“Participei da campanha mundial de erradicação da pólio (End Polio Now), que é capitaneada pelo Rotary International e seus parceiros, momento em que decidi que deveria terminá-lo [o livro e doar os royalties (100%) de sua venda para a campanha. Como a Fundação Bil e Melinda Gates doa outros dois dólares para cada um que o Rotary arrecadar, os Royalties do meu livro acabam também sendo triplicados em benefício da erradicação da pólio. E a humanidade está perto de conseguir essa façanha.”
Sadi tem uma relação pessoal com a pólio: “Eu saí de casa aos três anos e fiquei até os onze em regime de internato para tratamento das sequelas da pólio em uma entidade porto-alegrense. Passei por cerca de 14 cirurgias ao longo da vida que me permitiram caminhar apenas com uma bengala.”
Processo criativo
Para o servidor, “todo aquele que deseja escrever um livro não pode simplesmente ficar aguardando a inspiração chegar para colocar algo no papel. Haruki Murakami, consagrado escritor Japonês que indico a todos que desejam tornar a escrita um hábito, traça um paralelo entre escrever um romance e correr uma maratona no seu livro ‘Do que eu falo quando falo de corrida’. Ambas as atividades exigem determinação, persistência e treinamento. No processo criativo, isso consiste em administrar a criatividade, ou seja, treinar a mente para que o processo criativo ocorra dentro do espaço e tempo programados. E, de fato, é isso o que ocorre, a força do hábito acaba doutrinando a mente e as coisas fluem”.
Nos momentos em que ocorrem os bloqueios criativos, pesadelo para alguns criadores, Sadi recorre a um dos livros que inspiram sua vida: o romance “Cem Anos de Solidão”, do escritor e ganhador do Prêmio Nobel de Literatura, Gabriel García Márquez.
“Ler uma passagem ou outra desse livro é para mim um verdadeiro ‘destranca ruas’ em termos de soltar o pensamento e a imaginação, muito embora o meu ‘A lei do Tempo’ não seja um romance de realismo mágico. No livro que estou escrevendo atualmente, neste sim, há episódios insólitos com pitadas de realismo mágico (guardadas, obviamente, as devidas proporções). Machado de Assis também tem o mesmo efeito”, disse.
Publicado em formato e-book, Sadi explica que seguiu pelo caminho da autopublicação e dá algumas dicas para quem pretende divulgar suas produções literárias. “E não me refiro à situação em que o escritor banca a impressão de seu próprio livro em alguma gráfica a preços exorbitantes e, sim, aproveitando plataformas como, por exemplo, à da Amazon e semelhantes, que permitem colocar à venda livros sem custo algum para o escritor. Depois, é contar com o auxílio dos conhecidos. São eles que irão permitir ao escritor furar a ‘bolha’ e ser conhecido fora do círculo de relacionamentos. Um caminho que, de modo algum pode ser desprezado, é o dos concursos literários. Recomendo a todos, não apenas a quem gosta de escrever e pretenda tornar-se escritor, a assinatura do ‘Publishnews’. É gratuito e traz informações importantes acerca do mercado editorial, eventos e concursos literários .”
Sobre o livro
“A revisão crítica de ‘A Lei do Tempo’ esteve a cargo da escritora Letícia Wierchowski (autora de mais de 20 livros, dentre os quais ‘A casa das sete mulheres’ traduzido para vários países e que inclusive virou série televisiva). Meu livro narra a história de Salomão. O personagem principal que, ainda menino, por força de uma tragédia familiar, acaba em um orfanato, juntamente com o irmão, Tino. Separados pelo destino, os dois irmãos seguem rumos diferentes na vida. Salomão é adotado por uma família de posses, e cresce com a expectativa de um dia reencontrar o irmão, que nunca mais vira e passou a viver nas ruas de Porto Alegre. Adulto, Salomão conhece a mulher da sua vida, que, no entanto, esconde dele um segredo acerca da sua experiência profissional que, digamos assim, não é daquelas que se possa mencionar em uma entrevista de emprego. Quando este passado de sua amada vem à tona, Salomão manda ela embora de sua vida. Não consegue, no entanto, tirá-la de seu pensamento. Arrependido, passa a procurar por ela sem encontrá-la e vai vivendo sua vida, cada vez mais sorumbático e introspectivo. Torna-se juiz, um juiz dogmático, com a mão pesada ao sentenciar. Um juiz conservador, que vive no passado, porque é lá que estão as lembranças de tudo que viveu ao lado de sua amada. ‘A Lei do Tempo’ é a história dessa busca de Salomão pelo irmão e pela mulher que ama e do desenlace destas buscas, que fará ao final Salomão encontrar-se consigo mesmo.”
O romance “A Lei do Tempo” está disponível no site da Amazon brasileira, em e-book pelo valor de R$ 9,99. O livro pode ser lido em dispositivos eletrônicos de leitura, em computador ou tablets. “A edição em meio físico está disponível apenas na Amazon americana, o que eleva sobremaneira o preço por conta do frete. Por isso, tenho feito encomendas em meu nome de acordo com a procura, passando a custar em torno de R$ 45,00 (dependendo da variação do dólar). A venda da versão digital rende um valor maior em termos de Royalties e, consequentemente, permite a aquisição de um número maior de vacinas em prol da campanha de erradicação da Pólio.”
Para entrar em contato com Sadi Pierozan, envie e-mail para spierozan@gmail.com ou mensagem para o perfil do escritor no Facebook.
Confira a seguir um trecho do livro:
(…) Com o passar dos meses, Salomão foi reclamando menos a presença dela à beira da cama. Alícia percebia que os fantasmas que atormentavam o sono do filho iam sendo relegados a uma parte esquecida de sua memória, de onde, raras vezes, vinham-no importunar. Alícia era feliz por sabê-lo feliz, ainda que, vez em quando, o surpreendesse melancólico pelos cantos da casa. E a melancolia de Salomão calava fundo na mãe, que não ignorava o motivo.
Como desejava poder mitigar aquela dor! Adivinhava, por vezes, a felicidade do filho se um dia ela adentrasse em casa trazendo o irmão desaparecido. Doía ver que Salomão crescia na incerteza da eterna procura. E o tempo não tardava a passar. Ainda ontem, trouxera-o para casa acuado, cheio de medos que ela, impotente, não pudera arrancar com as mãos. Fora necessário conquistar-lhe o afeto a cada dia. Transmitir-lhe segurança e compreensão, como uma ave que ensina seu filhote a alçar os primeiros voos. Longa fora a espera até o momento em que, com a emoção que não saberia exprimir em palavras, ouviu-o chamando-a de mãe. Agora, via-o crescido e surpreendia-se com a diferença. Antevia o momento em que o veria bater asas e alçar voos maiores, indo embora como ave migratória, em busca de seu espaço. Tinha a alegria de sabê-lo independente, mitigada por um sentimento involuntário de que se tornara um pouco órfã do filho. Uma orfandade diferente daquela que um dia vitimara Salomão. O paradoxo que vivem os pais. A felicidade de verem os filhos descobrindo seus espaços no mundo. A tristeza de perdê-los um pouco a cada dia. Surpreender-se ao descobrir, de repente, que o filho crescera. Indagar-se sobre o que fora feito do garotinho frágil, indefeso, que reclamava proteção. Vê-lo, um dia, com a família que terá construído e descobrir que já não está mais disponível para receber o aconchego que reclamava na infância, e que nada mais resta senão lamentar as oportunidades em que deixou de abraçá-lo. Ah! Se fosse possível às mães manter os filhos debaixo de suas asas! Mas eles pertencem ao mundo! Às suas novas famílias!
Era para elas que as mães os criavam! Aos relacionamentos novos que surgem a cada dia. Preferem estar com os amigos, com a namorada, com suas novas famílias, com seus próprios filhos. Então, um dia, de repente, eles também verão seus filhos baterem asas em busca de seus espaços. Era assim com todos! Era assim que deveria ser! Mas não deixava de ser nostálgico. (…)
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