A estrela de Maria do Socorro Malta
Existe alguma forma de descrever o que é a perda de um filho para uma mãe? Ou mesmo mensurar o tamanho da dor e da mudança na perspectiva de vida após um acontecimento deste? Ultrapassando os limites da lógica e usando a escrita como uma maneira de aceitar e superar a morte de sua filha, Maria do Socorro Malta Vila Nova, servidora do TRT15, escreveu o “Lágrimas para Kalinka”.
Entre memórias e versos, a autora relata fatos e deixa espaços que instigam o leitor a considerar as entrelinhas e construir um novo sentido. “Saiu-me de uma vez só, como um parto, porque fez-se sozinho e , ao ser externado, permitiu-me ter a sensação de, enfim, caírem-me as lágrimas que não conseguia derramar”, relata Maria do Socorro.
Por muitas vezes a sensação de nó na garganta toma conta de quem o lê e as palavras da amiga e incentivadora, responsável pela elaboração do prefácio, Ana Maria Melo Negrão, traduzem bem a sensação que nos toma conta. “Maria do Socorro textualizou e poetizou como a ausência, a saudade que dói e o pranto seco procuram companhia junto à rememoração”.
Em meio aos relatos de todos aqueles que fizeram parte da vida de Kalinka, as poesias dão um tom especial e por vezes dizem mais do que simples palavras conseguem traduzir.
Publicado pela All Print Editora, o livro pode ser comprado pelo site.
Confira duas das poesias que fazem parte do livro.
Kalinka – Minha pequena flor
Silêncio…
Por favor, absoluto silêncio!
Colheram-me a flor mais bela…
Sinto, ainda, no ar, sua fragrância:
A fragrância do seu deslocar-se…
Para onde a levaram? Para que? Por que?
Minha mimosa flor pequenina,
Sempre com jeito e sorriso de menina,
Mas compenetrada de mulher,
A confundir-se nos papéis de mãe e filha
…a aprender (de mim),
A ensinar (-me)…
Sinto-me sozinha, abandonada: atordoada!
Agora só me resta aspirar o perfume
Que ficou em seu lugar,
Para nunca esquecer-me que a ganhei um dia,
Que a tive,
Contudo a chamei de flor.
E, agora, arrancaram-na de mim,
Do meu coração,
Da minha alma,
Que, ora, vaga desolada
A evocar lembranças,
Sufocando-as, entretanto, para nunca a esquecer!
A chama-la em pensamentos
E a esperar o momento,
(tentando manter a lucidez)
De reencontrá-la,
De voltar a abriga-la
No meu coração, na minha alma…
… E, então,
Novamente, sorrirmos,
Chorarmos,
E, de novo, estarmos juntas…
Mas… por que lhe dei nome de flor?!
Destino
Gastamos grande parte de nossa vida a conjecturar,
a planejar nosso futuro,
achando que isso nos compete
…e que conseguiremos realizar nossos planos!
Coincidentemente (?!)
às vezes conseguimos um pouco dos nossos sonhos
e, ingenuamente, embriagados de alegria,
ficamos imaginando que podemos mais…
…ledo engano…
Mas, não sei se feliz ou infelizmente
temos que continuar nas trilhas
que ora pensamos escolher, ora aparecem do nada…
E lá vamos nós:
embalados pelo ritmo frenético e enganoso da vida,
a encher-nos de esperança
de que – um dia – atingiremos nossos objetivos…
Contudo, essa força que nos impulsiona,
esses desenganos que nos iludem
de que sofrendo ficamos mais forte,
enfraquecem-nos a cada novo dia,
matam-nos a cada instante…
Mesmo assim, eu mesma,
como muitos, sufoco esse desconforto
chamado desilusão
e me forço a enganar-me
de que vou conseguir sobreviver
segurando-me apenas numa palavra:
…esperança…
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