Tateando o novo: Liane Brito apresenta textos inéditos

“Escrever é como respirar”, disse a servidora do TRT1 que escreve simplesmente porque adora.

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Há dois anos, Liane Iracy de Brito nos presenteou com uma das frases mais lindas do blog Espaço Cultural: “Escrever é como respirar”. De lá para cá, pandemia, conflitos internacionais, o sol se pôs e nasceu centenas de vezes… o mundo deu muitas voltas, e para ela não poderia ter sido diferente. “Nestes dois anos do nosso último contato, aproveitei para morar na praia e curtir a vida. Era um sonho que eu realizei e foi muito legal.”

Para quem leu seus poemas e se encantou em 2020, a boa notícia: a servidora do TRT1 continua a escrever. “Na maior parte das vezes escrevo poesias, porque adoro. Outras vezes, contos, costurando histórias. Ínsito e belo no ser humano. Ultimamente, músicas. Tateando no novo”.

Embora ela “não se preocupe com publicações”, outra novidade, suas produções agora são compartilhadas no blog “Chocolate with banana”. “Estou levando uma surra para tentar aprender a postar no blog. Na verdade, só agora me interessei. Mas ainda vou precisar passar o que escrevi no laptop para ele. Coisas que fazemos sem pressa. É isso”, disse com bom-humor e, claro, naturalidade, tal como a respiração.

Confira abaixo duas produções de Liane Brito:

Quisera eu
Por Liane Brito

Quisera eu hoje acordar de um sonho que não foi bom,
Abrir meus olhos para ver uma realidade diferente, distante,
E nela, meu bem, encontrar tudo aquilo que sonhei:
Pessoas em banco de praça, dando risadas,
Crianças em algazarra, jogando bola;
Pais com tempo para brincar com seus filhos, empurrando balanços.
Jovens conversando, rindo.
Não há tempo para o eu, mas para o nós.
Pessoas indo e vindo, normalmente, sem medo de ser feliz e viver, interagindo entre si.
As casas não se estão gradeadas,
Os corações, braços e mãos estão abertos,
E todos se olham e agem como irmãos.

Chapeuzinho Vermelho e seu amigo Lobo (uma releitura da história de Chapeuzinho Vermelho)
Por Liane Brito

E então, Chapeuzinho Vermelho cresceu.
Agora todos no vilarejo a conheciam por Aurora e ela vivia na mesma casa de seus pais.
Seus reflexos no espelho mudaram, mas ainda via refletida sua face de menina, com olhos faceiros, e sorria.
Muito tempo passou.
No esplendor de seus 80 anos, a vida era calma, aprazível e ela estava satisfeita.
Sua mãe morava na casa da vovó e Aurora a visitava semanalmente.
Também como ela, acostumou-se a fazer doces, bolos, biscoitos, e os levava consigo para juntas tomarem café e compartilharem lembranças – mais dela que suas – sentadas no terraço em espreguiçadeiras, sentindo o cheiro das flores, ouvindo o cantar de pássaros e as águas do riacho próximo, retornando ao entardecer.
Arrumou-se com esmero, pegou o cesto com quitutes e a bengala, sua velha companheira, e seguiu logo cedo, pois não gostaria de se deparar com os lobos da região.
Havia notícias de pessoas estralhaçadas por lobos que costumavam atacar à noite nos bosques.
Por isso, saía e voltava cedo. Era destemida, mas também cautelosa.
Saiu de casa e seguiu em frente atravessando o bosque rapidamente em direção a casa.
Porém, o dia estava tão lindo… O sol reluzia por entre as árvores iluminando clareiras em tons furta-cores.
Distraiu-se por alguns momentos diante de tanta beleza, voltando, como de um sonho à realidade, ao ouvir a voz do lobo que dizia-lhe:
– Onde pensa que vai meu almoço?
Trêmula, perguntou:
– Seu o quê?
– Você ouviu: meu almoço!
– Jesus, Maria José e todos os santos, você pretende me comer???
– É claroooo. O que você pensa que vou fazer? Estou sem comer há dias e você apareceu como um pitéu.
E a olhava salivando…
Tentou argumentar alertando-o de que sua carne não era mais tão tenra, pois não possuía gordura para amaciar, mas não o demoveu de seu intento.
Ele se aproximou cada vez mais abrindo a boca enormeeee.
Sentiu o fim próximo.
Aurora então deu um passo atrás e falou:
– Que mau hálito horrível você tem! Você não escova os dentes?
Ele parou surpreso e falou:
– Verdade, tenho mau hálito?
– E como. Cruz credo!
Envergonhado, fechou a boca, tapou-a com as mãos e disse-lhe:
– Não ouse sair daí meu almoço. Vou ali escovar os dentes e já volto.
Ela, inocentemente, disse-se que não conseguiria sair dali nem que quisesse. Estava apavorada demais para isso. Sequer conseguiria sair do lugar.
Então, ele saiu.
E ela também, em direção oposta correu, mas correu tanto que tropeçou em algo duro e grande.
Ergueu os olhos e se deparou…
Pasme: outro lobo!
Estarrecida e chateada bravejou:
Outro lobo, não acredito!
Atirei pedra na cruz!
Reclamou, reclamou e depois de tanto reclamar, acabou percebendo ter acordado o lobo.
Calou-se de repente pensando: consegui piorar as coisas!
Encarou o lobo e enraivecida disse-lhe:
– Já sei, você vai querer me comer, não é?
Surpreso, ele respondeu:
– Quem, eu??? Tá doida, sou vegetariano e, além do mais, você é velha, deve ter a carne bem dura né Santa?
– Agora você exagerou!
Bengala em punho, aproximou-se dele com “sangue nos olhos”.
O bicho, que não era idiota, tratou de correr o mais rápido possível para longe dela reclamando:
– Não se pode dormir em paz neste bosque! Gosto mais dos escritores de eras remotas que faziam mocinhas apavoradas que nos deixavam dormir.
Os de agora trazem senhoras destemidas e armadas de bengalas para nos roubar a paz. Só Jesus na causa!
Aurora corria como podia atrás dele, mas não conseguiu alcançá-lo que corria muito mais.
“Cuspindo marimbondo”, voltou a seu destino, rumo à casa da mamãe.
Caminho livre, ar puro, paz e ninguém mais além de árvores, plantas e a casa que já podia ser vista ao longe.
Seguiu adiante.
E novamente distraiu-se com a beleza e a paz do lugar.
E foi o que bastou para se deparar com outro lobo.
Enraiveceu-se:
– Fala sério, isso está parecendo a historinha do Chapeuzinho Vermelho. Eu li a história e só tinha um lobo. Um!
Deu cria, inflacionou?
O lobo, ao ouvir suas reclamações falou:
– Calma moça eu sou da paz.
Estava aqui só descansando e apreciando a natureza. Sou sozinho, não tenho família e sinto falta de alguém para conversar.
– Uff, é só isso? Então vem comigo, vou passar a tarde com minha mãe você pode vir junto, o que acha?
– Adoraria. Obrigado.
Então vamos.
Seguiram juntos conversando.
E foi assim que todos na aldeia passaram a conhecer a história da Chapeuzinho Vermelho e seu amigo lobo.
Fim

Por

Por Liane Brito

Por este caminho vou,
Abro os braços como asas, lançando-me adiante,
Sempre em frente, confiante.

Há esperança e paz.
Bagagem que carrego no peito.
Nestes braços percebo a força que nasce como uma semente que germina o chão.
Os olhos indicam o caminho,
Os passos pisam firme o chão.
Deixam rastros, emitem ruídos em compasso com o coração.
A mente traça o trajeto.
Alguns conhecidos, outros a descobrir.
No íntimo o ânimo e a certeza de seguir.
Chama que não se apaga.
Fé que fraqueja, mas não se abala.
Bate coração.
Pulsa.
Expulsa o que está fora de lugar, pois aqui não pode ficar.
Adocica,
Estende a mão.
É obra do coração que expande.
Preenche, cresce.
É sua a culpa coração.
Comanda meus atos, indica a direção.
E eu o agasalho,
Faz parte de mim.
Uno-me a você.
Vamos juntos neste caminho.
Eu e você coração.

 

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