Ressarcimento ao erário. Processo CSJT-PP N. 852-67.2021.5.90.000. Interesse coletivo

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Novas ações para associados à ANAJUSTRA Federal.  - Freepick

Novas ações para associados à ANAJUSTRA Federal. – Freepick

A ANAJUSTRA Federal teve deferido o pedido de ingresso nos autos do Processo CSJT-PP n. 852-67.2021.5.90.000, para exercício da defesa de direito coletivo dos servidores. Não obstante a questão discutida tenha como objeto o direito individual de servidora representada por advogado constituído nos autos, a decisão daquele Conselho Superior da Justiça do Trabalho, que venha a ser proferida nos autos do processo, vincula a administração pública em relação às demais situações análogas, configurando o interesse coletivo a ensejar a legitimidade da Associação. Com esse fundamento foi realizado o pedido, pela Associação, deferido pela Excelentíssima Conselheira relatora, Desembargadora Maria Cesarineide de Souza Lima, que autorizou o ingresso da Associação para formular memoriais e efetuar sustentação oral.

O objeto da questão controvertida naquele processo diz respeito ao dever de restituir ao erário, os valores recebidos a maior, em decorrência de erro da administração, seja de fato ou de direito.
O Superior Tribunal de Justiça sedimentou a questão de devolução ao erário por meio dos Temas 531 e 1099. O primeiro, vem assentado na ementa:

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SERVIDOR QUE RECEBE INDEVIDAMENTE VALORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM RAZÃO DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DA LEI (TEMA 531):
“ERRO DE DIREITO” É incabível a restituição ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da Administração Pública. Quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto, ante a boa-fé do servidor público. Em virtude do princípio da legítima confiança, o servidor público, em regra, tem a justa expectativa de que são legais os valores pagos pela Administração Pública, porque jungida à legalidade estrita. Assim, diante da ausência da comprovação da má-fé no recebimento dos valores pagos indevidamente por erro de direito da Administração, não se pode efetuar qualquer desconto na remuneração do servidor público, a título de reposição ao erário. STJ. 1ª Seção. REsp 1.244.182-PB, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 10/10/2012 (Recurso Repetitivo – Tema 531).

No mesmo segmento está a Súmula 34, da Advocacia Geral da União:

Súmula 34-AGU: Não estão sujeitos à repetição os valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da Administração Pública.

Não obstante a questão tratada do Tema 531 tenha analisado à dispensa da devolução ao erário de valor recebido a maior, em decorrência do erro de direito [por má aplicação da lei] a jurisprudência da Corte Superior inovou para afastar o dever de ressarcimento, também na ocorrência de pagamento a maior em virtude de “erro de fato” [erro operacional], quando comprovada a boa-fé objetiva do beneficiado. A matéria foi apreciada pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na análise do REsp 1.769.306/AL, da Relatoria do Ministro Benedito Gonçalves. O julgamento ocorreu em 10/03/2021, admitida a repercussão geral, no Recurso Repetitivo – Tema 1009:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ARTIGO 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/1990. TESE DEFINIDA NO TEMA 531-STJ. AUSÊNCIA DE ALCANCE NOS CASOS DE PAGAMENTO INDEVIDO DECORRENTE DE ERRO DE CÁLCULO OU OPERACIONAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO. SALVO INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA. 1. Delimitação do Tema: A afetação como representativa de controvérsia e agora trazido ao colegiado consiste em definir se a tese firmada no Tema 531/STJ seria igualmente aplicável aos casos de erro operacional ou de cálculo, para igualmente desobrigar o servidor público, de boa-fé, a restituir ao Erário a quantia recebida a maior. 2. No julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.244.182/PB (Tema 531/STJ), definiu-se que quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, de boa-fé, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, o que está em conformidade com a Súmula 34 da Advocacia Geral da União – AGU. 3. O artigo 46, caput, da Lei n. 8.112/1990 estabelece a possibilidade de reposições e indenizações ao erário. Trata-se de disposição legal expressa, plenamente válida, embora com interpretação dada pela jurisprudência com alguns temperamentos, especialmente em observância aos princípios gerais do direito, como boa-fé, a fim de impedir que valores pagos indevidamente sejam devolvidos ao Erário. 4. Diferentemente dos casos de errônea ou má aplicação de lei, onde o elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o servidor recebeu o valor de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido indevidamente, na hipótese de erro operacional ou de cálculo, deve-se analisar caso a caso, de modo a averiguar se o servidor tinha condições de compreender a ilicitude no recebimento dos valores, de modo a se lhe exigir comportamento diverso perante a Administração Pública. 5. Ou seja, na hipótese de erro operacional ou de cálculo não se estende o entendimento firmado no Recurso Especial Repetitivo n. 1.244.182/PB, sem a observância da boa-fé objetiva do servidor, o que possibilita a restituição ao Erário dos valores pagos indevidamente decorrente de erro de cálculo ou operacional da Administração Pública. 6. Tese representativa da controvérsia fixada nos seguintes termos: Os pagamentos indevidos aos servidores públicos decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, estão sujeitos à devolução, ressalvadas as hipóteses em que o servidor, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. 7. Modulação dos efeitos: Os efeitos definidos neste representativo da controvérsia, somente devem atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão. 8. Solução ao caso concreto (inciso IV do art. 104-A do RISTJ): Cinge-se a controvérsia na origem acerca da legalidade de ato administrativo do Diretor Geral do Departamento de Administração de Pessoal da Universidade Federal de Alagoas – UFAL, onde se impôs ao impetrante, servidor público do Magistério Superior, o desconto em folha de pagamento de valores recebidos a maior no cálculo de parcela de anuênio no período de 22/2/2020 a 31/3/2015, na ordem de 2%. Como bem decidido pelo acórdão recorrido, de fato, era difícil a identificação do pagamento a maior por parte do servidor, haja vista que nos contracheques não constam o percentual nem a base de cálculo de anuênio. Assim, recebida de boa-fé, afasta-se a reposição da quantia paga indevidamente. 9. Recurso especial conhecido e improvido. Julgamento submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos.

A boa-fé objetiva, oriunda do direito privado, aplicada no âmbito da administração pública, é exigida na conduta do jurisdicionado perante a administração, nos termos da previsão trazida pela Lei n. 8.112/90, que impõe deveres e proibições ao servidor, obrigação legal que constitui um modelo de conduta social, um padrão ético comportamental no dever de agir e de atuar, inclusive nas suas relações com a administração pública, com honestidade, lealdade e probidade.

A ausência de má-fé do beneficiário no recebimento de valor a maior é caracterizada pela legítima confiança e fé pública que deposita na relação com a administração, uma vez ciente de que os atos daquela são norteados pelos princípios trazidos no artigo 37, caput, do Texto constitucional. Nesse norte, a confiança do administrado, depositada na administração, leva o servidor a acreditar que os valores que lhe foram pagos/depositados em sua conta salário, integram o seu patrimônio jurídico. Essa crença decorre, acima de tudo, do seu dever de cidadão de presumir a existência de fé pública nos atos provenientes da administração, de forma a não colocar em dúvida o cálculo de pagamento que lhe era devido como indenização. A boa-fé, portanto, decorre do direito subjetivo do servidor em depositar segurança e confiabilidade nos atos e nas ações emanadas dos agentes administrativos. Caracteriza a boa-fé, por exemplo, o fato de o servidor não ter acesso à base de cálculo de valores lançados em seu contracheque e tampouco às regras de cálculos que ensejaram o depósito de valor em sua conta salário, situação que afasta qualquer possibilidade de se ter consciência da existência de erro que possa ter resultado em pagamento a maior a seu favor.

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, analisou o caso em que o servidor recebeu indevidamente valores da administração pública em razão de interpretação errônea da lei. Ao apreciar o MS 31244 AgR-segundo, da Relatoria do Ministro Luiz Fux, no julgamento ocorrido em 22/05/2020, decidiu: “As quantias percebidas pelos servidores em razão de decisão administrativa dispensam a restituição quando: a) auferidas de boa-fé; b) há ocorrência de errônea interpretação da Lei pela Administração; c) ínsito o caráter alimentício das parcelas percebidas, e d) constatar-se o pagamento por iniciativa da Administração Pública, sem ingerência dos servidores beneficiados.”

Também apreciado pela Corte Suprema, Segunda Turma, a matéria relativa à devolução de valor recebido indevidamente da administração pública em razão de erro operacional, objeto do ARE 1203420 AgR, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, julgado em 16/08/2019: “(…) 3. Servidor Público Estadual. Verba recebida a maior. Pagamento espontâneo do Ente Público decorrente de erro operacional. Servidor de boa-fé. Impossibilidade de restituição. Precedentes. 4. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. (…)”

No mesmo sentido a jurisprudência da Segunda Turma do STF que apreciou a matéria objeto do MS 34243 AgR, da relatoria do Ministro Edson Fachin, julgado em 07/03/2017. No julgamento assentou que, atendidos os pressupostos estabelecidos pelo TCU e pela jurisprudência da Corte – boa-fé do servidor; ausência de influência, pelo servidor, na concessão da vantagem; existência de dúvida plausível sobre a interpretação, validade ou incidência da norma infringida; interpretação razoável, embora errônea, da lei pela Administração – descabe a restituição de valores percebidos indevidamente.

Seja pela ocorrência de erro de direito ou de erro operacional (inclusive de cálculo) a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e da Suprema Corte Federal são uníssonas em adotar o mesmo fundamento, qual seja, não existindo má-fé por parte do beneficiado que recebeu valor maior do que o devido, deve ser dispensada a devolução.

Caso Concreto

Na análise do processo há informação de que o pagamento realizado pela administração, foi auditado internamente, ou seja, passou pelo crivo do Controle Interno do Órgão pagador que o aprovou. Esse fato serve como prova da boa-fé da servidora, quando recebeu pagamento de indenização pago pela administração, considerando que o próprio Controle Interno do órgão pagador não detectou qualquer erro operacional quando da auditoria interna ocorrida nos autos. O suposto “erro operacional/cálculo” foi detectado muito tempo após a ocorrência da auditoria interna, quando servidor da folha de pagamento, seguindo critério subjetivo de convicção, levantou a questão. Sob a sua ótica subjetiva, tratou a questão como erro de cálculo.

Não obstante, a matéria alusiva à base de cálculo é destacada pela controvérsia jurídica a respeito de quais parcelas remuneratórias servem de cálculo para o pagamento da “indenização”, ante a ausência de previsão expressa na lei. O que se evidencia é a confusão na utilização de base de cálculo utilizada para pagamento do período de afastamento pelo usufruto de licença prêmio, prevista na redação originária do artigo 87, da Lei 8.112/90, com a base de cálculo indicada para pagamento de indenização por licença prêmio não usufruída.

A razão da distorção decorre da redação originária do artigo 87 [alterada pela Lei 9.527/97] tratava apenas da base de cálculo utilizada para o pagamento do período relativo à licença prêmio usufruída, indicando expressamente a base de cálculo: a remuneração do cargo efetivo. Mas esse dispositivo legal, na redação de origem, nada dispôs sobre a base de cálculo nos casos em que a licença prêmio não era usufruída. Contudo, a própria Lei n. 8.112/90, traz o artigo 78, que trata especificamente da base de cálculo de indenização, quando se refere a férias indenizadas, no seu § 4º. Estabelece expressamente nesse parágrafo que a “indenização” será calculada com base na remuneração do mês em que for publicado o ato exoneratório. Importante notar que o dispositivo legal traz assentado o termo “remuneração”, sem qualquer distinção entre a “remuneração do cargo efetivo” ou a “remuneração do servidor”. A diferença entre os termos é de fundamental importância para a questão, de forma a afastar a existência, inclusive, de erro de direito na aplicação da lei, pela administração.

Anoto que a Lei 8.112/90, embora não trate especificamente das parcelas que compõem a remuneração do servidor, deixa assentado no caput e nos §§ do seu artigo 41, que todas as formas remuneratórias ali assentadas compõem a remuneração do servidor. É o que se extrai daquele dispositivo, que no caput e o § 3º, do artigo 41, faz referência à remuneração do cargo efetivo e, no § 2º destaca a remuneração do cargo em comissão, o que enseja a interpretação de a remuneração do cargo efetivo mais a remuneração do cargo em comissão são somadas para se encontrar a “remuneração do servidor” A conclusão que enseja o reconhecimento da existência de erro de direito no cálculo da indenização encontra amparo na Lei n. 8.852/94, que é clara ao estabelecer a diferença entre os conceitos relativos à “remuneração do cargo efetivo” no inciso II, do artigo 1º [compostas por parcelas trazidas no plano de cargo e salários das categorias respectivas] e, a “remuneração do servidor”, que vem expressa no inciso III, do mesmo artigo 1º. Neste conceito trazido no inciso III, a remuneração do servidor é integrada pelas parcelas que compõem a remuneração do cargo efetivo, acrescida de “quaisquer vantagens” nestas incluindo, expressamente, o valor pago a título de exercício do cargo em comissão previsto no artigo 62, da Lei 8.112/90.

A aplicação do artigo 37, caput, da CF/88, obriga a administração a observar que a remuneração a título de retribuição pelo exercício do cargo em comissão é trazida dentro do Título III da Lei 8.112/90, que trata dos direitos e das vantagens. No capítulo II, deste Título, estão elencadas as “vantagens”, dentre as quais as gratificações previstas no inciso II, do artigo 49. A gratificação/retribuição pelo exercício do cargo em comissão é trazida no artigo 62, dentro do mesmo Título e do mesmo Capítulo da Lei, que trata de vantagens.

Portanto, na questão relativa à base de cálculo para as indenizações, não impondo a lei qualquer limitação, para que seja utilizada na base de cálculo as parcelas específicas que compõem a remuneração do cargo efetivo, não cabe à administração proceder tal restrição, mas apenas aplicar a disposição legal que se refira à base de cálculo de indenização, que, no caso, é aquela indicada no § 4º, do artigo 78, que traz assentado na sua redação o termo “remuneração”, sem qualquer adjetivo restritivo. Decorre desses fundamentos a possibilidade de levar a administração a incorrer em erro de direito, na aplicação da lei. Casos análogos chegam ao Poder Judiciário para que seja dirimida a questão. A respeito, cito a ementa do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. INCLUSÃO DO ABONO DE PERMANÊNCIA E DO AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO NA BASE DE CÁLCULO DA REMUNERAÇÃO PARA FINS DE CONCESSÃO DE LICENÇA-PRÊMIO. AGRAVO INTERNO DO DISTRITO FEDERAL DESPROVIDO. 1. O acórdão recorrido encontra-se em consonância com o entendimento adotado por esta Corte de que as rubricas que compõem a remuneração do Servidor deverão ser incluídas na base de cálculo da conversão da licença-prêmio em pecúnia, dentre elas o auxílio-alimentação, o abono de permanência e a saúde suplementar. Nesse sentido: REsp. 1.489.904/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25.11.2014, DJe 4.12.2014. 2. Agravo Interno do DISTRITO FEDERAL desprovido. (AgInt no AREsp 475.822/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/12/2018, DJe 19/12/2018) destaquei.

Nesse sentido, também está a Jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. LICENÇA PRÊMIO NÃO GOZADA E NEM UTILIZADA EM DOBRO PARA CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO. CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. BASE DE CÁLCULO. 1. É possível a conversão em pecúnia dos meses de licença prêmio por assiduidade não usufruídos pelo servidor aposentado nem computados em dobro para fins de aposentadoria ou abono permanência, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração. Precedentes. 2. O cálculo da licença-prêmio convertida em pecúnia deve se dar com base em todas as verbas de natureza permanente, em quantia correspondente à da última remuneração do servidor quando em atividade, inclusive abono de permanência, adicional de insalubridade e auxílio alimentação, se for o caso. (TRF4, AC 5013115-05.2020.4.04.7000, TERCEIRA TURMA, Relatora V NIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 29/04/2021) Destaque nosso.

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. LICENÇA-PRÊMIO NÃO USUFRUÍDA E NÃO COMPUTADA EM DOBRO PARA FINS DE APOSENTADORIA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. BASE DE CÁLCULO. 1. As rubricas abono de permanência, o auxílio-alimentação, o terço constitucional de férias e a gratificação natalina são verbas de caráter permanente que compõem a remuneração, razão pela qual, em quantia correspondente à da última remuneração do servidor quando em atividade, devem compor a base de cálculo da conversão da licença-prêmio. 2. O montante referente às férias deve compor a base de cálculo das parcelas devidas a título de licença-prêmio não usufruída e convertida em pecúnia, desde que devidas ao servidor à época de sua aposentadoria. (TRF4, AC 5026042-31.2019.4.04.7002, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 15/09/2020).

A jurisprudência trazida serve para demonstrar que há controvérsia na aplicação da base de cálculo para o pagamento da indenização pelo não usufruto da licença prêmio. Os julgados consideram, para o cálculo, as parcelas que compõem a última “remuneração do servidor”, quando em atividade. Assim entendendo [que deve ser aplicada as parcelas que integram a remuneração do servidor] sequer haverá erro no cálculo do pagamento da indenização. Caso contrário, ao firmar entendimento que a base de cálculo da indenização deve ser composta por parcelas que integram a remuneração do “cargo efetivo”, restará então presente o erro de direito na aplicação da lei, no que se refere a composição da base de cálculo da indenização, que integrou o cargo em comissão, previsto no § 2º, do artigo 41, da Lei 8.112/90, na composição da base de cálculo da remuneração do servidor. Nesse caso, caracterizado o erro de direito cometido pela administração, não comporta a indenização ao erário, em decorrência da presunção de boa-fé objetiva, nos termos do Tema 531, já mencionado.

Ainda que o pagamento realizado a maior pela administração se enquadre como erro de fato, a má-fé não está presente no recebimento. Noto dos autos que a decisão da administração, ao determinar a devolução, pela devedora, não traz como fundamento do dever de devolver, qualquer fato que possa caracterizar a existência de participação ativa ou omissiva do beneficiado no cálculo do pagamento a maior. Tampouco fundamenta a devolução em existência de qualquer outro ato que pudesse caracterizar a má-fé no recebimento. Ao contrário, cristalino nos autos que o cálculo realizado e, que a base de cálculo utilizada, decorre de ato unilateral da administração, sem qualquer participação da servidora beneficiada. Antes do pagamento não houve nos autos do processo administrativo [onde ocorreu o cálculo do pagamento da indenização] qualquer controvérsia levantada pela servidora acerca das parcelas remuneratórias que seriam utilizadas no cálculo da indenização, fato que soma a favor da servidora, comprovando que não interferiu na escolha das parcelas que compuseram a base de cálculo para se encontrar o valor da indenização. Presente, portanto, a boa-fé objetiva exigida na jurisprudência do STJ (Tema 1009).

A existência de boa-fé objetiva da servidora beneficiada, também está comprovada pelos fatos ocorridos nos autos. Cito, como prova, a ocorrência de auditoria previamente realizada pelo Controle Interno do Tribunal, que não detectou qualquer ocorrência de erro que pudesse ensejar no pagamento a maior. Quando aos olhos da auditoria interna não foi possível detectar a existência de erro, ou de pagamento a maior, não se mostra razoável que a administração repasse ao servidor a responsabilidade de presumir que havia erro ou valor a maior na indenização que lhe foi paga, mormente quando os critérios e regra de cálculo utilizados à época eram totalmente ignoradas pela servidora. Provada está a boa-fé objetiva, que dispensa o ressarcimento decorrente de erro de fato.

Importante trazer à baila o recente julgado, publicado em 22 de novembro de 2021, do Conselho Superior a Justiça do Trabalho, que na análise do requerimento da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho da 10ª região- AMATRA-X, sobre a devolução de valores recebidos de boa-fé, decidiu:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – ORIENTAÇÃO NORMATIVA – TRT – PAGAMENTO INDEVIDO DE PAE – MAGISTRADOS – REAJUSTE INDEVIDO – PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ. 1. A Suprema Corte é enfática quando estabelece em sua jurisprudência que a reposição, ao erário, do quantum percebido pelos servidores torna-se desnecessária, quando se evidencia estar presente sua boa-fé, ausente, por parte do servidor, a influência ou a interferência para a concessão da vantagem impugnada, estar existente a dúvida plausível sobre a interpretação, validade ou incidência da norma infringida, no momento da edição do ato que autorizou o pagamento da vantagem impugnada, e estar presente interpretação razoável, embora errônea, da lei pela Administração. (MS 25641, Relator Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 22/11/2007).

2. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no Tema 531/STJ de que o recebimento de boa-fé pelo servidor e a natureza alimentar das vantagens pecuniárias recebidas são suficientes para o não cabimento da devolução do montante pago indevidamente pela Administração, especialmente em razão da natureza alimentar de tais verbas. Da mesma forma, quando do julgamento do Tema 1.009/STJ, que diz respeito à manutenção daquele entendimento da dispensa de devolução nos casos em que reconhecida a boa-fé, mesmo não se tratando de interpretação equivocada de lei, mas de erro de cálculo ou erro operacional.

3. A Advocacia Geral da União (AGU), e o Tribunal de Contas da União (TCU), em obediência à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, editaram enunciados de súmulas que consagram o entendimento definitivo de que o quantum recebido de forma indevida pelos servidores, em razão de decisão errônea tomada pela Administração, não são (sic) restituíveis (sic) ao erário público, quando presente o princípio da boa-fé.

4. Procedimento de Controle Administrativo procedente, para reconhecer a incidência na espécie do art. 3º da Resolução do CSJT nº 254/2019 e da Súmula nº 249 do TCU, isentando os magistrados-substituídos da devolução ao erário do montante percebido de boa-fé. Procedimento de Controle Administrativo procedente (Processo:CSJT-PCA – 501-94.2021.5.90.0000, Redator: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Julgamento: 22/10/2021, Publicação: 22.11.2021).

Destaca-se da transcrição que o Conselho Superior da Justiça do Trabalho aplica a Jurisprudência do STJ, trazida nos Temas 531 e 1009, mencionados.

Conclusão

A Jurisprudência firmada nas repercussões gerais reconhecidas pelo Superior Tribunal de Justiça, seja em decorrência de erro de direito ou de erro operacional, dispensam a restituição quando presente a boa-fé objetiva, considerando, ainda, a natureza alimentar da pecúnia paga em decorrência de direito que integra o patrimônio do servidor. O pagamento a maior, em decorrência de erro de direito, pela má aplicação da lei, faz presumir a existência de boa-fé objetiva, dispensando a devolução ao erário (Tema 531)
O erro operacional que culmina em pagamento a maior, é passível de devolução, salvo se o beneficiado provar que agiu de boa-fé, no recebimento do valor.

No caso concreto, o erro nasceu por força da utilização de parcelas que compõem a remuneração do servidor, tendo a administração entendido, posteriormente ao pagamento, que base de cálculo a ser utilizada é restrita às parcelas que compõem a remuneração do cargo efetivo. Portanto, caracterizado erro de direito, apto a dispensar a devolução ao erário, nos termos do Tema 531, do STJ. Ainda que se entenda pela existência de erro operacional, decorrente de erro de acréscimo/soma das parcelas que compuseram a base de cálculo que serviram para o pagamento da indenização, a ausência de demonstrativo de cálculo para se encontrar o valor da indenização, no contracheque da beneficiada, e a inexistência de notificação da servidora, dando-lhe conhecimento prévio das parcelas que compuseram a base de cálculo da indenização devida, afasta a possibilidade de conhecimento prévio da existência do erro cometido pela administração, que culminou no pagamento a maior. Por qualquer ângulo que se analise o caso concreto, a devolução ao erário deve ser afastada, com fundamento no artigo 3º da Resolução do CSJT nº 254/2019 e da Súmula nº 249 do TCU e, dos Temas 531 e 1009 da repercussão geral analisada pelo STJ. O caso concreto dos autos do processo em trâmite perante o CSJT comporta a dispensa da devolução ao erário, do montante percebido a maior, porque comprovada a boa-fé. A abrangência da decisão de efeito vinculante emanada do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, justifica o pedido da ANAJUSTRA Federal para que seja aplicado pelos Tribunais Regionais e, também no âmbito do colendo TST, o mesmo entendimento firmado nos Temas 531 e 1099, firmado nos julgamentos dos processos repetitivos perante o Superior Tribunal de Justiça.

*Servidora aposentada. Exerceu o cargo de Diretora-Geral do TRT24. Advogada inscrita na OAB-MS 1.7979. Diretora de Assuntos Legislativos da ANAJUSTRA Federal.

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