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Vantagem do Artigo 193 da Lei 8.112/90: decisão do Tribunal de Contas da União

18/02/2022 14:55 | Fonte: Glauce de Oliveira Barros

Leia a íntegra do estudo da diretora de assuntos legislativos da ANAJUSTRA Federal, Glauce de Oliveira Barros

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Diretora de assuntos legislativos, Glauce de Oliveira Barros é também autora de um Estudo Técnico que revela ilegalidades da PEC 32/2020. - ANAJUSTRA Federal Diretora de assuntos legislativos, Glauce de Oliveira Barros é também autora de um Estudo Técnico que revela ilegalidades da PEC 32/2020. - ANAJUSTRA Federal
Resumo. Abordagem à decisão do Tribunal de Contas da União [TC 035.933/2019-4, acórdão nº 565/2021], sob a ótica do histórico que compõe o normativo jurídico Brasileiro, amparado verticalmente aos ditames da Constituição Federal. Inconstitucionalidades encontradas no acórdão: i) usurpa a competência do Supremo Tribunal Federal e do Poder Legislativo; ii) viola o princípio da separação dos Poderes da República; iii) exorbita a competência constitucional atribuída pelo artigo 71, III, da CF/88; iv) viola: o direito adquirido; o ato jurídico perfeito; a coisa julgada; o princípio da segurança jurídica; o caráter contributivo do regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos; No âmbito infraconstitucional, a decisão exorbita as atribuições traçadas pela Lei n. 8.443/92, nega existência às normas vigentes que compõem o sistema jurídico brasileiro, que permitem a incorporação de vantagem remuneratória que compõe a base de cálculo para a incidência do tributo previdenciário, no proventos da aposentadoria; viola: as Leis nºs. 8.112/90, 8.911/94, 8.852/94, 9.624/98.

Palavra chave. Vantagem. Artigo 193. Lei 8.112/90. Lei 8.911/94. TCU.

Controle de constitucionalidade. Competência do STF

O acórdão resulta do acolhimento de representação formulada pela Secretaria de Fiscalização de Integridade de Atos e Pagamentos de Pessoal e de Benefícios Sociais – Sefip, em fiscalização automática e contínua nos dados cadastrais e nas folhas de pagamento de diversos órgãos da Administração Pública Federal (TC-022.202/2019-6). A violação legal detectada na fiscalização vem justificada no fato de o entendimento firmado no acórdão TC n. 1.599/2019, que analisou aposentadoria de servidor do Ministério Público Federal, não estava sendo observado pelos demais órgãos da administração pública. Acolhida, por meio do processo TC 035.933/2019-4, acórdão TC nº 565/2021, o Tribunal de Contas da União – TCU determina aos órgãos da Administração Pública Federal direta, autárquica ou fundacional, que no prazo de 15 (quinze) dias da notificação, iniciem os procedimentos para identificação dos casos e, promovam a oitiva de todos os aposentados e pensionistas que se encontrem na situação descrita no processo, com vistas à regularização, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, do pagamento da vantagem denominada “opção”, prevista no art. 193 da Lei 8.112/1990, devendo, os órgãos, adotarem os parâmetros alinhados nos itens do acórdão: 9.2.1.1. o pagamento da “opção” deverá ser suprimido, no caso dos beneficiários cujos atos de concessão foram emitidos há menos de cinco anos e se encontrem pendentes de julgamento pelo TCU; 9.2.1.2. o pagamento da “opção” deverá ser transformado em vantagem pessoal, a ser absorvida por quaisquer reajustes futuros, no caso dos beneficiários cujos atos de concessão foram expedidos há mais de cinco anos, desde que ainda não tenham sido julgados ou considerados tacitamente registrados pelo TCU; 9.2.1.3. o pagamento da “opção” deverá ser transformado em vantagem pessoal nominalmente identificada, sujeita exclusivamente ao reajuste geral dos servidores públicos federais, no caso dos beneficiários cujos atos de concessão tenham sido julgados legais ou considerados tacitamente registrados pelo TCU há mais de cinco anos; 9.2.2. promovam levantamento e enviem, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, à apreciação desta Corte de Contas, os eventuais atos de aposentadoria e de pensão civil que contemplem o pagamento da parcela “opção” nas circunstâncias tratadas neste processo, expedidos há mais de cinco anos, por meio do sistema e-Pessoal, caso ainda não o tenham providenciado; 9.2.3. se abstenham de emitir novos atos de concessão que contenham a irregularidade tratada nestes autos. 9.3. ordenar à Sefip que: 9.3.1. no prazo de 15 (quinze) dias, inicie os procedimentos para identificação dos casos de todos os aposentados e pensionistas que se encontrem na situação descrita neste processo, cujos atos de concessão tenham sido julgados legais ou considerados tacitamente registrados pelo TCU há menos de cinco anos, com vistas à promoção da revisão de ofício, prevista no art. 260, § 2º do Regimento Interno, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias.

Na análise do acórdão paradigma [n.1.599/2019-Plenário], o TCU apreciou o ato de aposentadoria de servidor do Ministério Público Federal, que teve incorporado em seus proventos o percentual estabelecido no artigo 2º da Lei 8.911/94. Não obstante, a indicação expressa do fundamento legal que ampara o ato, o órgão fiscalizador, naqueles autos, utiliza os fundamentos do artigo 193, da Lei 8.112/90, e assenta cristalina confusão entre dois institutos jurídicos tratados em legislações distintas: um com natureza jurídica previdenciária, e outro com natureza jurídica remuneratória. Ultrapassa a questão infraconstitucional, por entender que a análise das leis é desnecessária, e inova a jurisprudência da Corte, realizando controle difuso de constitucionalidade, interpretando a redação do artigo 40, § 2º, da CF/88, afasta a aplicação de normas infraconstitucionais limitando proventos do servidor, determinando a exclusão de parcelas que o compõe, inclusive em relação às aposentadorias já registradas naquela Corte. Mais. Invoca o caráter contributivo e a natureza solidária da contribuição previdenciária estabelecida no caput do artigo 40 da CF/88 e, a limitação remuneratória do § 2º, do mesmo dispositivo constitucional e conclui: “4. Em síntese, a concessão da “opção” após a edição da EC 20, passou a ser inconstitucional por dois motivos: em primeiro lugar, porque os proventos de aposentadoria não poderão ser superiores à remuneração percebida pelo servidor em atividade, e, depois, porque desrespeita o regime contributivo instituído pela inovação constitucional, pois sobre essa vantagem, inexistente na ativa, não houve incidência de contribuição previdenciária”. Ainda que não declarada expressamente a inconstitucionalidade incidental, o ato que aprecia a lei em confronto com o Texto constitucional, afastando a aplicação da norma inferior, caracteriza exercício de controle difuso de constitucionalidade (STF, Súmula Vinculante n. 10); exorbita a competência do Poder Judiciário (CF/88, artigos 5º, XXXV e 97); desrespeita o princípio da separação dos Poderes da República, trazido no artigo 2º, da Constituição Federal; viola direito adquirido (CF/88, artigo 5º, XXXVI) já incorporado ao patrimônio jurídico do servidor; e extrapola a competência estabelecida no artigo 71, III, da Lei Maior.

Realiza, na decisão, verdadeira prestação jurisdicional ex officio no bojo do processo administrativo “fiscalizatório”, fundamentado em jurisprudência resultante de apreciação de ato de concessão inicial/ individual de aposentadoria de servidor do MPU. Impõe à Administração Pública Federal, o dever de aplicar a jurisprudência daquela Corte, em detrimento da lei. Assim procedendo, viola o artigo 59, da Lei Maior, que não elenca a jurisprudência entre as normas apreciadas por meio de processo legislativo. Em consequência, viola o princípio da legalidade esculpido nos artigos 5º, II e 37, da CF/88, quando afasta a aplicação dos dispositivos legais que regulamentam o direito à integração da vantagem no cálculo dos proventos da aposentadoria.

O direito de incluir/incorporar a remuneração recebida em atividade, pelo exercício de cargo em comissão, é expressamente previsto nas Leis: 8.112/90, artigos 41, § 1º, 49, § 2º, 62, caput; 8.911/94: artigos 2º, 4º e 11, c/c os artigos 1º e 13 da Lei n. 9.624/98. O valor da vantagem recebida em atividade é incluído na base de cálculo para a incidência do tributo previdenciário.

Ao proferir decisão com efeito normativo, atingindo toda a Administração Pública Federal, o TCU usurpa a competência de legislar atribuída ao Poder Legislativo [artigos 2º e 59, do Texto constitucional] violando o princípio constitucional da separação dos Poderes da República. Afronta, também, o artigo 5º, inciso II da CF/88, quando impõe cumprimento de decisão, sob pena de responsabilidade, para que os órgãos afastem a aplicação do artigo 193 da Lei 8.112/90 e do artigo 2º, da Lei 8.911/94 [denominadas, indistintamente por aquele Órgão, de “vantagem opção”, em clara confusão jurídica dos institutos].

A Constituição Federal conferiu o exercício do Poder Legislativo ao Congresso Nacional (CF/88, artigo 44), composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, não estando incluído na composição de sua estrutura o Órgão auxiliar de controle externo. Consequentemente, o órgão auxiliar não tem competência para editar atos, resoluções ou instruções de natureza normativa, em matéria de Direito, obrigando o cumprimento pelos órgãos da administração pública. O artigo 71, da Norma Maior, separou as competências do Tribunal. No inciso III tratou da competência para “apreciar” atos de concessão “inicial” de aposentadoria (atos sujeitos a registro) diferenciando da competência de “fiscalizar” os atos e contratos não sujeitos a registros, trazidos nos incisos V e VI. A Lei n. 8.443 de 1.992, norma processual que define critérios de procedimento, elenca as competências do Tribunal no seu artigo 1º. No inciso V deste artigo, repete a redação do inciso III, do artigo 71, da CF/88. No capítulo II, dessa Lei, trata da fiscalização a cargo do Tribunal e, na seção III, desse capítulo, dispõe sobre a fiscalização dos atos sujeito a registro. Nesta seção III está inserido o artigo 39, que traz na redação do caput e do inciso II, a competência do Tribunal para apreciar, para fins de registro ou reexame, os atos de: II - concessão inicial de aposentadoria, reformas e pensões, bem como de melhorias posteriores que tenham alterado o fundamento legal do respectivo concessório inicial.

O procedimento como se dará a fiscalização dos atos sujeitos a registro, já vem expresso na Lei n. 8.443/92. O Capítulo II disciplina o procedimento da fiscalização a cargo do Tribunal, separando, na seção II, os atos sujeitos a registro e, na seção III, os atos e contratos (não sujeitos a registro). Estabelece como deve proceder o Tribunal na apreciação do ato inicial concessório, na redação do caput do artigo 39. Neste artigo, de forma clara, determina que o procedimento é conforme a direção dos artigos constitucionais indicados na redação do caput daquele artigo, dentre eles o artigo 71, III, da CF/88. Portanto, nos termos do artigo 71, III, da CF/88 e do artigo 39, II, da Lei Orgânica do TCU, a fiscalização do ato sujeito a registro deve ser realizada por meio de “apreciação do ato inicial de concessão”, não comportando o procedimento adotado na representação objeto do acórdão TC 565/2021, que realizou fiscalização por meio das folhas de pagamento dos órgãos da administração [procedimento estabelecido na lei para os atos não sujeitos a registro]. Com amparo nessas disposições constitucionais/legais mencionadas, é que se aponta a ilegalidade no ato do Tribunal de Contas da União, que utiliza do procedimento aplicado na fiscalização de atos e contratos não sujeitos a registro [fiscalização por meio de folha de pagamento], para emitir decisão que alcança os atos de aposentadorias sujeitos a registro, desvirtuando todo o procedimento legal estabelecido na Lei 8.443/92, que segue na linha da competência restrita trazida no artigo 73, III, da CF/88.

O parágrafo único, do inciso II, do artigo 39, da Lei 8.443/92, ao prever em sua redação que os atos sujeitos a registro serão apreciados pelo Tribunal na forma estabelecida no Regimento Interno, se refere a forma pelo qual o ato se apresenta no direito administrativo: i) material [relativa à existência ou inexistência do ato]; ii) jurídica [forma prevista em lei, sob pena de invalidação do ato].

O Regimento Interno do Tribunal de Contas da União, traz expresso em seu enunciado, que aquela norma interna corporis regulamenta as atribuições que lhe conferem os artigos 73 e 96, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal; 1º, inciso X, e 99, da Lei nº 8.443/1992. O artigo 73 da Constituição Federal trata da competência administrativa do Tribunal, assentando o quantitativo de Ministros integrantes daquela Corte; fixa a sede do Tribunal no Distrito Federal e dispõe sobre o quadro próprio de pessoal; prevê jurisdição em todo o território nacional, e, no que couber, as atribuições previstas no artigo 96 da CF/88. Este último dispositivo constitucional trata da competência privativa do tribunal, elencando, como tal: as competências administrativas; a autonomia financeira e, o funcionamento dos órgãos jurisdicionados. Especificamente no inciso I, alínea “a”, dispõe sobre essas competências específicas: “I - aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;” Por sua vez, a Lei 8.443/92 dispõe no artigo 1º, X, sobre a competência daquele Órgão para elaborar e alterar seu Regimento Interno; e no artigo 99, fixa o quórum para a aprovação desse regimento. Nos termos da Lei mencionada, o artigo 16, V, do RITCU [invocado no acórdão como suporte de legalidade daquele procedimento] não encontra validade na lei para a finalidade que foi utilizada. Tampouco o Regimento Interno da Corte lhe confere esse status. Mencionado artigo está inserido no Título II, do RITCU, que trata da organização daquele órgão. Ao prever que aquela Corte delibere sobre propostas de fixação de entendimento de especial relevância para a Administração Pública, sobre questão de direito, estabelece o quórum de aprovação [2/3 dos ministros, inclusive ministros substitutos convocados.] Apenas estabelece à forma como se dará a deliberação daquela matéria, ou seja, com o quórum de 2/3 dos ministros. O Regimento Interno é norma de organização administrativa, sempre adstrito à previsão da lei, em sentido formal, que estabeleça a competência do órgão e o procedimento a ser adotado no desempenho das competências administrativas. A Norma Interna que estabelece a organização e forma de funcionamento da Corte não tem o alcance de conferir legalidade ao procedimento adotado, e tampouco validar o julgamento, porque nele não houve a apreciação in concreto de ato de concessão de aposentadoria, mas análise abstrata de uma situação fática colocada em procedimento de fiscalização de folha de pagamento que faz alusão a desobediência da jurisprudência da Corte.

O artigo 4º da Lei n. 8.443/92 e o artigo 73 da CF/88, não conferem competência, à Corte, para legislar sobre matéria relativa a servidor público, sequer dizer o direito por meio de decisões com efeitos normativos, para serem impostas aos órgãos da Administração Pública. A iniciativa de normas aplicadas ao servidor público é privativa do Presidente da República (CF/88, artigo 61, § 1º, “c”) e, a competência para expedir resoluções, com efeito normativo, é das Casas do Congresso Nacional [Câmara e Senado] artigo 59, VII, da CF, observada a competência em razão da matéria. Além das previsões exaustivas dos tipos de normativos jurídicos que devem ser submetidos ao processo legislativo trazido no artigo 59, da Lei Maior, somente o Poder Judiciário terá a competência para dizer o direito sobre questões controvertidas estabelecidas em lei [CF/88, artigo 2º e 5º, XXXV].

O comando genérico emanado da decisão, com efeito normativo, do TCU, em análise abstrata, ultrapassa a competência “apreciadora” de ato concessório inicial de aposentadoria e viola o artigo 71, III, do Texto Constitucional. Mais. Os fundamentos registrados no voto do acórdão TC n. 565/2021 [a exemplo dos itens 07 a 11] caracterizam o exercício de função jurisdicional, própria do Poder Judiciário. O Órgão de Controle usurpa a competência do controle constitucional conferida ao Supremo Tribunal Federal (CF, artigo 102, inciso I, alínea “a”). A decisão proferida no acórdão paradigma [TC 1.599/2019, que fundamenta a representação, realizou controle de constitucionalidade no caso concreto. Já o acórdão TC 565/2021, ao adotar os fundamentos da jurisprudência invocada na representação, realiza o controle de constitucionalidade, in abstrato, quando aprecia o artigo 40, § 2º, da CF/88, interpretando a sua redação, e registra que a partir da publicação da EC n. 20/98, que trouxe nova redação ao dispositivo mencionado, os proventos de aposentadoria estão limitados à remuneração do cargo efetivo em que se deu a aposentadoria. Para proceder a interpretação do § 2º, do artigo 40, da CF/88, o Tribunal se afasta do conceito legal atribuído ao termo “remuneração do servidor”, pela Lei n. 8.852/94, que relaciona a composição do conceito no artigo 1º, III.

Caso análogo, do afastamento da aplicação de lei por violação ao artigo 40, caput, e § 2º, da CF/88, na redação trazida pela EC 20/98, foi objeto do processo TC 021.009/2017-1, que determinou o arquivamento de representação interna daquele órgão, onde se postulava o exercício do controle prévio e in abstrato de constitucionalidade. No mencionado processo, o Tribunal de Contas da União assentou que a jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal lhe conferia competência para o controle “concentrado” de constitucionalidade, invocando a Súmula do STF, n. 347, mas não o controle in abstrato. Ocorre que a Suprema Corte, em diversos julgados não autoriza qualquer controle de constitucionalidade por aquela Corte, ou seja, o STF caminha na contramão do entendimento do TCU e, fundamenta que a Súmula n. 347 não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1.988; que somente os órgãos do Poder Judiciário tem competência constitucional para exercer o controle de constitucionalidade da lei [MS 25.888 MC, rel. min. Gilmar Mendes, dec. monocrática, j. 22-3-2006, DJ de 29-3-2006].

Nos autos do Mandado de Segurança 35.494, o STF fundamenta a incompetência da Corte Fiscalizadora, nos termos da decisão do Ministro Alexandre de Moraes, cito:

(...)o Tribunal de Contas da União é órgão técnico de fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, cuja competência é delimitada pelo artigo 71 do texto constitucional. Sendo inconcebível, portanto, que o Tribunal de Contas da União, órgão sem qualquer função jurisdicional, exerça controle difuso de constitucionalidade nos processos sob sua análise, ao pretenso argumento que lhe seja atribuída tal competência em virtude do conteúdo da Súmula 347/STF, editada em 1963, cuja subsistência ficou comprometida pela promulgação da Constituição Federal de 1988. (...) Não bastasse a configuração do desrespeito à função jurisdicional e a competência exclusiva do STF, essa hipótese fere as funções do Legislativo (...)Diante do exposto, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, DEFIRO O PEDIDO LIMINAR para suspender os efeitos do ato impugnado na TC 021.009/2017-1, unicamente em relação aos substituídos pelo impetrante e, consequentemente, determinar que o Tribunal de Contas da União, nos casos concretos submetidos à sua apreciação, se abstenha de afastar a incidência dos §§ 2º e 3º dos artigos 7º e 17 da Medida Provisória 765/2016, convertida na Lei 13.464/2017.

A decisão que defere o pedido liminar no MS 35.494 foi mantida no julgamento de mérito, publicado em 06.05.2021, com trânsito em julgado em 02.06.2021. Também é daquela Corte Suprema a decisão nos autos do MS 35.824 que aprecia a mesma matéria, assentando fundamentos que merecem transcrição:

(...) Há, assim, limitação constitucional de sua competência, no que diz respeito ao caso concreto, à apreciação de legalidade de atos administrativos de aposentadoria submetidos à sua análise técnica, com base na Constituição Federal e na legislação positivada. É inconcebível a hipótese de o Tribunal de Contas da União, órgão sem qualquer função jurisdicional, permanecer a exercer controle de constitucionalidade nos julgamentos de seus processos, sob o pretenso argumento de que lhe seja permitido em virtude do conteúdo da Súmula 347 do STF, editada em 1963, cuja subsistência, obviamente, ficou comprometida pela promulgação da Constituição Federal de 1988. (...) Dentro dessa perspectiva constitucional de sua definição, organização e fortalecimento institucional, é inconcebível a hipótese de o Tribunal de Contas da União, órgão administrativo sem qualquer função jurisdicional, exercer controle de constitucionalidade nos julgamentos de seus procedimentos, sob o pretenso argumento de que lhe seja permitido em virtude de sua competência constitucional para zelar, em auxílio ao Congresso Nacional, pelo controle externo da Administração Pública. (...) Porém, a possibilidade de exercício do controle de constitucionalidade pelo TCU é mais grave do que somente a configuração de usurpação de função jurisdicional por órgão administrativo, em virtude da extensão dos efeitos de suas decisões para todos os procedimentos administrativos no âmbito da Administração Pública. O controle difuso exercido administrativamente pelo Tribunal de Contas traria consigo a transcendência dos efeitos, pois, na maioria das vezes, ao declarar a inconstitucionalidade ou, eufemisticamente, afastar incidentalmente a aplicação de uma lei federal, o TCU não só estaria julgando o caso concreto, mas também acabaria determinando aos órgãos de administração que deixassem de aplicar essa mesma lei para todos os demais casos idênticos, extrapolando os efeitos concretos e inter partes e tornando-os erga omnes e vinculantes no âmbito daquele tribunal.

Tal qual a decisão proferida pelo STF em ação direta de inconstitucionalidade, o TCU também conferiu a sua decisão os efeitos: ex tunc, erga omnes e vinculante, quando determina a revisão de todos os atos de aposentadoria concedidos a partir da vigência da Emenda Constitucional 20/98, sem distinção [item 27 do voto.] Determina a exclusão de vantagem prevista em lei, que integrou o cálculo dos proventos e, também veda a inclusão, nos proventos de futuras aposentadorias, de vantagem prevista em lei, recebida em atividade, nos termos trazidos no comando dos itens 9.2.1.1; 9.2.1.2; 9.2.1.3; 9.2.2; 9.2.3; 9.3 e 9.3.1, do acordão. No fundamento do voto restringe o direito de todos os servidores aposentados, inclusive daqueles que já tiverem os seus atos apreciados e registrados, nos termos dos itens 14 a 18 e 27 do voto do acórdão.

Recente julgado do STF [MS 35.500] da Relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, publicado no DJE em 5.5.2021, ampara a conclusão da inconstitucionalidade da decisão, apontada: (...) Impossibilidade de o controle difuso exercido administrativamente pelo Tribunal de Contas trazer consigo a transcendência dos efeitos, de maneira a afastar incidentalmente a aplicação de uma lei federal, não só para o caso concreto, mas para toda a Administração Pública federal, extrapolando os efeitos concretos e interpartes e tornando-os erga omnes e vinculantes.

O Tribunal de Contas também não tem competência para determinar aos órgãos da administração que modifiquem os atos de aposentadoria. Mas no item 13 do voto do acórdão n. TC 565/2021, determina que o órgão pagador dos proventos suprima de imediato a vantagem “opção”, com fundamento no seu poder de autotutela, age como Órgão superior aos demais da Administração pública, que sequer são vinculados jurídico ou administrativamente àquele Órgão de controle. A inconstitucionalidade do acórdão n. 565/2021, e também daquele utilizado como paradigma, encontra amparo no entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, quando analisou o alcance do poder de regulamentação trazido no artigo 96, I, “a” da CF/88, no julgamento da ADI 5240-SP. A questão do alcance da competência do TCU em relação aos órgãos da administração pública submetidos ao controle externo também é objeto do CC 6987, da relatoria do Min. Sepúlveda Pertence (DJ de 30.04.92). Nos autos do processo mencionado, a Corte Suprema registra:” são diversas e inconfundíveis as áreas de atuação do TRT, que age como órgão de administração ativa, e do TCU, como órgão de controle de legalidade, sem poder, contudo, para alterar o ato controlado. No mesmo sentido está a decisão proferida pelo Supremo Tribunal nos autos do processo CJ 6975, da relatoria do Ministro Néri da Silveira (DJ de 23.04.93): O TRT não pode ser compelido, pelo TCU, a modificar o ato de aposentadoria, nele incluindo a vantagem que a Corte de Contas considera indevida. O TCU, a sua vez, não há de ser constrangido a registrar o ato, que não tem como legal. Somente o órgão judiciário competente poderá dirimir, em decisão

Embora não declare expressamente a inconstitucionalidade da lei federal, o Tribunal retira a sua eficácia no âmbito da Administração Pública. Exerce, por via indireta, verdadeiro controle concentrado de constitucionalidade em decorrência do efeito vinculante, de alcance erga omnes que conferiu à sua decisão. Abrange todos aqueles que se aposentaram a partir da vigência da EC 20/98 e os que irão se aposentar, prejudicados pela restrição do direito perpetrada na decisão do TCU que exercita, inconstitucionalmente, competência própria do Supremo Tribunal Federal. Caracterizada está a violação aos artigos 2º e 102, inciso I, alínea “a”, da CF/88.

Comparando a decisão do TCU com a matéria examinada pela Corte Suprema, na da ADI 3345 e, parafraseando o Ministro CELSO DE MELLO, no voto proferido naqueles autos, concluo que o acórdão TC 565/2021 encerra em seu conteúdo material, clara norma de decisão, impregnada de autonomia jurídica e revestida de suficiente densidade normativa: fatores que bastam para o seu conhecimento, de que o ato estatal em questão possui o necessário coeficiente de normatividade qualificada, apto a torná-lo suscetível de impugnação em sede de fiscalização abstrata.

Competência Revisional e Decadência Administrativa

A jurisprudência do TCU, formalizada por meio de enunciado de súmula, o ato normativo e a decisão normativa emanada daquele Tribunal, não têm força executiva. É o que estabelece o próprio Regimento Interno da Corte. Serve, apenas, para orientar a adoção de critérios de uniformização de procedimentos a serem adotados na fiscalização e apreciação dos atos e contratos [artigo 67 do RITCU]. Somente o órgão concessor pode fazer melhorias no ato apreciado. Decorrência lógica é a existência de revisão, apenas, quando o órgão concessor alterar o “fundamento legal” do ato apreciado. Não há na lei ou no Texto constitucional a outorga de competência para que o Tribunal realize, de ofício, a revisão de atos de aposentadorias já registrados perante aquela Corte.

O artigo 260, do Regimento Interno, invocado pelo Tribunal para dar suporte à revisão “in abstrato” de atos já registrados, não encontra suporte na legal. É a Constituição [artigo 73, III] com redação repetida na Lei Orgânica da Corte [artigo 39, II] que traça os limites do poder revisional daquele Tribunal, abrindo uma exceção única, qual seja, quando o órgão concessor alterar o fundamento legal do ato concessório inicial. Fora dessa situação expressamente estabelecida na Constituição Federal e na Lei Orgânica mencionada, não há falar em competência revisional de ato registrado. Portanto, o TCU não tem competência para realizar revisão, de ofício, de ato de aposentadoria já registrado tácita ou concretamente. A disposição do artigo 260, do seu Regimento Interno, somente se aplica aos servidores/ministros subordinados ao próprio TCU, por força da disposição da Lei 9.784/99, artigo 53 e 54. Vale dizer, os atos emitidos por aquela Corte, na qualidade de administrador, podem ser revistos, mas sujeitos ao prazo decadencial “a contar da data da emissão” do ato concessório. Redação outra que venha inserida no Regimento Interno, caracterizando ampliação da competência da Corte, mesmo em relação aos servidores a ele vinculados administrativamente, não encontra suporte de constitucionalidade e tampouco de legalidade, em decorrência da limitação de competência trazida na Lei n. 8.443/92 (artigo 39) que repete o Texto constitucional (artigo 71, III).

Nesse norte traçado pela Constituição Federal pelas normas infraconstitucionais, o ato de aposentadoria com o registro perante o TCU, que analisou e declarou a sua legalidade, publicado no Diário Oficial para conhecimento e efeitos perante terceiros, está aperfeiçoado, constituindo—se em ato jurídico perfeito (CF, artigo 5, XXXVI) e faz coisa julgada administrativa, só comporta revisão na eventual hipótese de, posteriormente ao registro, for modificado para melhorias, que resultaram em alteração dos fundamentos do ato concessivo inicial, pela autoridade emissora do ato concessivo. É esse o comando contido no artigo 71, III, da Constituição Federal de 1.988 e no artigo 1º, V e 39, II, da Lei 8443/94. Outra não é a orientação contida na Instrução Normativa n. 55/2007 do TCU que trata da remessa dos atos àquele Tribunal. Dispõe no seu artigo 2º, as situações que configuram alteração do ato inicial concessivo, trazendo no inciso VII, desse artigo que a alteração do fundamento legal de ato concessório. Alterada pela IN n. 78, de março de 2018, a mesma redação foi repetida no artigo 2º, VII, onde orienta que a autoridade administrativa, responsável por ato de admissão ou de concessão de aposentadoria, reforma ou pensão submeterá ao Tribunal, para fins de registro, informações relativas à alteração de concessão. Evidencio, nos §§ 1º e 2º, do artigo 2º, da Instrução Normativa 78/2018, o acréscimo de várias situações relativas à alteração do ato concessório que deve ser submetida ao TCU. Registro que outras competências para a revisão de ato de aposentadoria trazidas, na mencionada Instrução Normativa, caracterizam inconstitucionalidade, não competindo ao TCU ampliar a competência revisional que implique violação ao artigo 71, III, da CF/88.

O prazo decadencial para a análise do ato concessório inicial não comporta mais controvérsia, a par da decisão do Supremo Tribunal Federal, que fixou a tese do tema 445 da repercussão geral no RE 636.553/RS. No fundamento do brilhante voto elaborado pelo relator, Ministro Gilmar Mendes, restou analisado, inclusive, a impossibilidade de revisão do ato registrado:

(...) Diante de todo o quadro já exposto, verifica-se que a discussão acerca da observância do contraditório e da ampla defesa após o transcurso do prazo de 5 anos depois da chegada do processo ao TCU encontra-se prejudicada. Isso porque findo o referido prazo, o ato de aposentação considerar-se-á registrado tacitamente, não havendo mais a possibilidade de alteração pela Corte de Contas. Sugiro, então, a fixação da seguinte tese de repercussão geral, a ser aplicada de maneira objetiva aos recursos extraordinários que versem sobre as mesmas questões (...) em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas.

O acórdão transitou em julgado em 05 de março de 2021, não obstante o TCU assentou no item 27 do voto do acórdão 565/2021, que a decisão se aplica indistintamente a qualquer ato de aposentadoria, mesmos os já registrados, caracterizando, o acórdão, violação à coisa julgada e ao direito líquido e certo do servidor, que já teve o ato concessório de aposentadoria inicial, registrado (CF/88, artigo 5º, XXXVI). Consequentemente, decorrido o prazo decadencial para revisão, pelo TCU, de atos concessivos de aposentadoria inicial, emitidos pelos órgãos da Administração Pública Federal.

A violação ao artigo 37, caput da CF/88 também se faz presente, no acórdão analisado. A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro [LINDB] traz expresso em seu artigo 24 (incluído pela Lei n. 13.655/2018) a proibição de revisão nas esferas administrativas, quanto à validade do ato: A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente constituídas.

Caracterizada a inconstitucionalidade do acórdão TC n. 565/2021, o servidor que suportar os efeitos negativos da decisão emanada da determinação, tem legitimidade para recorrer à Corte, no prazo de 15 dias corridos, a contar de sua notificação pessoal. A controvérsia sobre a matéria de direito não impede seja impetrado Mandado de Segurança, inclusive coletivo (STF/Súmula 625). Encontrando-se suspenso os efeitos do acórdão, por eventual recurso administrativo, poderão, ao final da suspensão recursal administrativa, ajuizar a ação mandamental perante o STF, alegando a inconstitucionalidade da decisão, conforme prevê a Lei n.12.016/2009, artigo 5º.

Remuneração do Cargo Efetivo e Remuneração do Servidor. Diferença Conceitual

A EC n. 20/98 não inova o § 2º, do artigo 40, da CF/88. Desde a Constituição Federal de 1967 a limitação dos proventos à remuneração recebida em atividade já constava do seu artigo 101, § 3º . A redação original da CF/88, nos §§ 3º e 5º, do artigo 40, já se referia aos termos sinônimos: “remuneração do servidor” e “vencimentos do servidor”. A Lei nº 8.112/90 estabelece uma significação básica para o conceito de vencimento do cargo efetivo e remuneração do cargo efetivo, no seu artigo 40 e 41, mas não traz em seus dispositivos o conceito do termo “remuneração do servidor” que é trazida na redação do artigo 40, §§ 2º e 3º, do Texto constitucional. Nada obstante, a Lei n. 8.852/94, posterior a de n. 8.112/90, define o termo e disciplina especificamente a matéria, inclusive para a incidência da contribuição previdenciária [nos termos expressos no artigo 1º, da Lei n. 9.630, de abril de 1998].

A Lei n. 8.852/94 indica as expressões “vencimentos do cargo efetivo”, “vencimento básico” e “remuneração”, distinguindo os significados e fixando conceitos legais e, no artigo 1º, III, conceitua: como remuneração, a soma dos vencimentos com os adicionais de caráter individual e demais vantagens, nestas compreendidas as relativas à natureza ou ao local de trabalho e a prevista no art. 62 da Lei nº 8.112, de 1990, ou outra paga sob o mesmo fundamento. O que a Lei n. 8.852/94 denomina de “vencimentos” (plural), se referindo à remuneração “do cargo efetivo”, a Lei n. 8.112/90 denomina vencimento (singular) indicando parcelas que compõe a remuneração do cargo efetivo. Mas o termo “remuneração”, trazido na Lei 8.852/94, reflete o conceito de “remuneração do servidor”, incluindo na composição, a vantagem do artigo 62, da Lei 8.112/90, ou seja, se refere, o conceito, da composição da remuneração do servidor. Na Lei 8.112/90 a remuneração dessa vantagem [do artigo 62] é tratada separadamente da remuneração do cargo efetivo, sendo trazida no § 1º, do artigo 41, de forma a deixar claro que a remuneração do cargo em comissão não faz parte da remuneração do cargo efetivo, mencionada no caput do mesmo artigo 41. Portanto, o conceito de remuneração apresentado no inciso III, transcrito, que inclui a soma do vencimento básico com as vantagens permanentes relativas ao cargo, emprego, posto ou graduação e, acresce à soma os adicionais de caráter “individual” e as vantagens “pessoais” pagas ao servidor, inclusive aquela prevista no artigo 62 da Lei 8.112/90, com alcance de vantagens e adicionais pessoais, não deixa dúvida de a composição remuneratória nela especificada se referir à remuneração do servidor, ou seja, aquela que inclui a remuneração do cargo efetivo, acrescida dos adicionais e vantagens de caráter individual, inclusive a vantagem para a título de remuneração pelo desempenho das atribuições do cargo em comissão/função que o servidor que ocupa/ocupou. É esse o alcance do termo “remuneração do servidor” trazido no artigo 40, §§ 2º e 3º do Texto constitucional, conforme consta do histórico da alteração de sua redação, oriunda da PEC 33-C/95, nos termos do parecer do relator da Emenda Aglutinativa 6, dessa proposta de emenda, que foi aprovada e incorporada ao texto da CF/88, nos §§ 2º e 3º, do artigo 40.

Nos anais da EC n. 20/98, consta que em 13 de fevereiro de 1996, foi apresentada ao Plenário, pelo então Deputado Euler Ribeiro, designado para proferir parecer em substituição à comissão Especial - CESP. Esse relator apresentou substitutivo à PEC 33-A/95, trazendo a redação ao § 1º do artigo 40 da Constituição, que fazia referência ao limite remuneratório do provento atrelado à remuneração do “cargo efetivo”, publicada no Diário da Câmara dos Deputados, do dia 14, de fevereiro de 1996. Especificamente na página 04471 desse diário está a redação do substitutivo: “§ 1º. O valor mensal dos proventos de aposentadoria não poderá exceder a “remuneração do cargo ocupado pelo servidor em atividade”, sendo-lhe garantida a integralidade desta, desde que atendidos, de forma cumulativa, requisitos quanto a tempo de contribuição, idade mínima e tempo mínimo de exercício no cargo respectivo, conforme dispuser a lei complementar referida no caput deste artigo.” Essa redação, contudo, foi desprezada pelo Poder Constituinte Derivado Reformador, em 20 de março de 1996, com a apresentação de Emenda Aglutinativa n. 6, pelos Deputados: Inocêncio Oliveira, líder do Bloco PFL/PTB; José Aníbal, líder do PSDB; Geddel Vieira Lima, na qualidade de líder do PMDB e Luiz Carlos Santos, líder do Governo. Designado para relator o Deputado Michel Temer, para proferir parecer a Emenda Aglutinativa em substituição a CESP, que conclui pela aprovação. Na página 11.863, do Diário da Câmara dos Deputados, de 30 de abril de 1996, encontramos a justificativa da PEC 33-C/95 e a Emenda aglutinativa n. 6, apresentada pelos Deputados mencionados: “A presente Emenda Aglutinativa resulta da fusão do texto da Proposição inicial com o das emendas apresentadas junto à Comissão Especial, destinada a apreciar o mérito da PEC nº 33-C, de 1995, a que modifica o sistema de previdência social, estabelece normas de transição e dá outras providências. O texto derivado da aglutinação das sugestões apresentadas na referida Comissão expressa, portanto, a convergência das várias opiniões e interesses da sociedade; consubstanciadas nas posições defendidas pelos Parlamentares, autores das respectivas proposições, constituindo, assim, aperfeiçoamento necessário a serem introduzidos na Proposta apresentada pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional. (...) 8. Elimina-se a possibilidade de concessão de aumentos decorrentes da passagem do servidor para a inatividade, proibindo-se que o valor dos proventos exceda a remuneração percebida pelo servidor quando em atividade (art. 40, § 2°) e impõe-se o limite constitucional estabelecido no art. 37, XI, aos valores das aposentadorias e pensões pagas pelo setor público. Assegura-se reajustamento dos proventos de aposentadoria e pensão em termos distintos da proposta apresentada pelo Poder Executivo. Preserva-se a paridade dos proventos em relação ao comportamento da remuneração dos servidores em atividade e permite-se a concessão aos inativos de vantagens e demais benefícios, inclusive os decorrentes de transformação ou reclassificação de cargos ou funções (art. 40, §§ 2° e 3º) A proposta original garante tão somente o reajuste para preservar o valor real dos proventos.” (Destaques não constam do original).

Ao acolher a Emenda aglutinativa n. 6, para alterar a nomenclatura “remuneração do cargo efetivo” e incluir o termo “remuneração do servidor” na redação da EC 20/98, o Constituinte revisor deixou claro que o conceito de remuneração trazido no texto constitucional é o indicado na Lei n. 8.852/94, vigente na data da apreciação da PEC, cujo alcance ultrapassava a composição remuneratória fixada para o cargo efetivo, abarcando todas as verbas que compõem a “remuneração do servidor”.

Do histórico exposto é possível afirmar que a limitação imposta pelo TCU é inconstitucional, com expressa rejeição da mesma interpretação assentada nos anais da EC n. 20/98. O desprezo da definição legal do conceito “remuneração do servidor”, trazido na Lei 8.852/94, viola o artigo 37 da CF/88. Também viola o 71, III, da Lei Maior, que impõe ao TCU o dever de fiscalizar a legalidade do ato, não lhe competindo interpretar a Constituição Federal, mas aplicar a lei vigente que ampara o ato de aposentadoria.

Contribuição Previdenciária sobre a Vantagem

Nos itens 4 e 5 e 11 do voto que culminou no acórdão TC 565/2021, está assentado outro fundamento limitador dos proventos da aposentadoria, sob a ótica do TCU, que adotando premissa sem qualquer fundamento legal que a ampare, conclui que não existindo o recebimento da “parcela opção na ativa” por força da revogação do artigo 193, da Lei 8.112/90, não houve incidência de contribuição previdenciária sobre o valor, ocorrendo desrespeito ao sistema contributivo instituído pela inovação constitucional.
O benefício previdenciário do artigo 193 só era pago a partir da aposentadoria do servidor, por se tratar de composição de proventos. Somente com a vigência da EC n. 41/2003, que fez previsão da contribuição sobre proventos, o benefício do artigo 193, da Lei 8.112/90, passou a fazer parte da base de cálculo da contribuição previdenciária. O servidor não recebia/recebe, na atividade, a vantagem do artigo 193, mas a vantagem do artigo 62, da Lei 8.112/90, que sempre serviu e serve da base de cálculo da contribuição previdenciária. É essa vantagem que dá origem ao benefício do artigo 193, justamente por integrar a base de cálculo do tributo. Por esse motivo, jamais poderia ser utilizado como base de cálculo da contribuição, antes da EC 41/2003. Atualmente, a mesma vantagem do artigo 62 da Lei 8.112/90 é paga ao servidor e tratada no artigo 2º, da Lei 8.911/94, cujo valor decorrente da opção realizada “em atividade” compõe a “sua” remuneração [remuneração do servidor] e, integra a base de cálculo da contribuição previdenciária.

Data vênia, equivocada está, a premissa adotada pelo TCU, diametralmente oposta ao que estabelecem os dispositivos legais vigentes. Não menos importante trazer à balha, a Lei n. 9.630, de abril de 1998, [vigente quando da aprovação da EC 20/98]. No seu artigo 1º, estabelece a alíquota e a base de cálculo para a incidência da contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração conforme definida no inciso III do art. 1º da Lei nº 8.852, de 4 de fevereiro de 1994, ou seja, a vantagem prevista no artigo 62, da Lei 8.112/90, ou outra paga sobre o mesmo fundamento, vem expressamente indicada no conceito de remuneração apontado pela lei previdenciária, servindo de base de cálculo para a incidência do tributo.
A questão relativa às parcelas que incorporam aos proventos da aposentadoria é objeto do Tema 163, da repercussão geral nos autos do Recurso Extraordinário n. 593.068-SC, que traz assentada a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a respeito da questão:

Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. REGIME PRÓPRIO DOS SERVIDORES PÚBLICOS. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS SOBRE PARCELAS NÃO INCORPORÁVEIS À APOSENTADORIA. 1. O regime previdenciário próprio, aplicável aos servidores públicos, rege-se pelas normas expressas do art. 40 da Constituição, e por dois vetores sistêmicos: (a) o caráter contributivo; e (b) o princípio da solidariedade. 2. A leitura dos §§ 3º e 12 do art. 40, c/c o § 11 do art. 201 da CF, deixa claro que somente devem figurar como base de cálculo da contribuição previdenciária as remunerações/ganhos habituais que tenham “repercussão em benefícios”. Como consequência, ficam excluídas as verbas que não se incorporam à aposentadoria. Ademais, a dimensão contributiva do sistema é incompatível com a cobrança de contribuição previdenciária sem que se confira ao segurado qualquer benefício, efetivo ou potencial. 4. Por fim, não é possível invocar o princípio da solidariedade para inovar no tocante à regra que estabelece a base econômica do tributo. 5. À luz das premissas estabelecidas, é fixada em repercussão geral a seguinte tese: “Não incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público, tais como ‘terço de férias’, ‘serviços extraordinários’, ‘adicional noturno’ e ‘adicional de insalubridade.” 6. Provimento parcial do recurso extraordinário, para determinar a restituição das parcelas não prescritas.

Nos termos do tema n. 163, havendo lei que preveja a incidência de contribuição previdenciária sobre o valor recebido, fará jus, o servidor, à sua integração no cálculo da aposentadoria. Nesse norte, faz necessário trazer à baila as legislações que incluem a gratificação do artigo 62 na base de cálculo para a incidência da contribuição ao regime próprio de previdência: i) A Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março de 1993, acresceu a redação do parágrafo 6º no artigo 40 da Constituição Federal, estabelecendo que a remuneração do servidor serviria de custeio para os proventos de sua aposentadoria: § 6º. As aposentadorias e pensões dos servidores públicos federais serão custeadas com recursos provenientes da União e das contribuições dos servidores, na forma da lei; ii) A Lei 8.688, de 21 de julho de 1993, regulamentando o parágrafo 6º acrescido pela Emenda Constitucional nº 3/93, alterou a redação dada ao artigo 231 da Lei 8.112/90, estabelecendo que o custeio das aposentadorias e pensões continuaria sendo de responsabilidade do servidor, cuja contribuição mensal passou a incidir sobre “sua” remuneração, se referindo ao servidor (artigos 3º e 4º); iii) a Lei 9.783/1.999, no parágrafo único do artigo 1º, assentou o conceito de remuneração de contribuição: o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, os adicionais de caráter individual, ou “quaisquer vantagens”, inclusive as relativas à natureza ou ao local de trabalho, ou outra paga sob o mesmo fundamento. Ao se referir a quaisquer vantagens, remeteu ao artigo 62 da Lei 8.112/90, que se encontra inserido dentro do capítulo dessa Lei, que trata “das vantagens”. Independentemente de o artigo 193, da Lei 8.112/90 ter sido revogado em 1.997, a contribuição previdenciária, nos termos da Lei 9.783/99, continuou incidindo sobre o valor da vantagem que lhe dá origem, àquela do artigo 62, do Regime Jurídico do Servidor Público, recebida em atividade até os dias atuais. Integrando o ordenamento jurídico, a Lei n. 9.717, de 27 de novembro de 1998, que dispõe sobre regras de organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados Distrito Federal e Municípios, dos militares dos Estados e do Distrito Federal, teve a redação do seu artigo 1º, alterada pela MP 2.187-12, sucedida pela MP 2.187-13, de agosto de 2001 pra incluir vedação no artigo 1º, X: vedação de inclusão nos benefícios, para efeito de cálculo e percepção destes, de parcelas remuneratórias pagas em decorrência de função de confiança, de cargo em comissão ou do local de trabalho. Contudo, continuou incidindo a contribuição previdenciária sobre o valor, nos termos da Lei 9.783/99 que continuava vigente. A Administração Pública, obrigada está a nortear os seus atos pelo princípio da legalidade, artigo 37, caput da CF/88. Tem como obrigação, em observância à legislação vigente, proceder a retenção da contribuição, na forma estabelecida na lei de 1999. Aliado ao princípio da legalidade, está o fato de a redação dada pelo artigo 8º, da MP 2.187-13 ao artigo 1º, X, da Lei 9.717/98, ter sido expressamente revogada pela Lei 10.887/2004, no seu artigo 18.

Nos termos da jurisprudência da Suprema Corte, a medida provisória apenas suspende os efeitos da lei a que faz referência, mas uma vez revogada por lei posterior, essa medida provisória não surte nenhum efeito no mundo jurídico [ADI 5.709, ADI 5.716, ADI 5.717 e ADI 5.727, rel. min. Rosa Weber, j. 27-3-2019, P, DJE de 28-6-201.] A Medida Provisória que inseriu a sua redação no mundo jurídico não foi aprovada pelo Congresso Nacional e, a redação do inciso X foi expressamente revogada pela Lei n. 10.887/2004, que acolheu a Medida Provisória n. 167, de 19 de fevereiro, de 2004. Entre os fundamentos da exposição de motivos assentados na MP 167, vale a pena citar: “(...) os novos preceitos constitucionais que carecem de regra específica para se tornar exequíveis são aqueles relativos ao cálculo dos proventos de aposentadoria. O art. 40, § 3º, da Constituição determinou a utilização das remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor a todos os regimes de previdência.” (Grifei e destaquei), ou seja, manteve o que já determinava o inciso X, do artigo 1º da Lei 9.717/99.

A Gratificação do artigo 62, da Lei 8.112/90. recebida pelo exercício da função/cargo comissionado, que deu origem à incorporação da gratificação prevista no artigo 193, da mesma lei é a mesma trazida no artigo 2º, da Lei 8.911/94, que serve até os dias atuais, de base de cálculo da contribuição previdenciária, nos termos das Leis n. 8.688/93; 9.630/98 e 9.783/99 e, o valor da vantagem continua servindo de base de cálculo para a incidência da contribuição previdenciária, nos termos estabelecidos pela Lei 10.887/2004, que dispõe, em sua redação original, no artigo 4º: a contribuição social do servidor público ativo de qualquer dos Poderes da União, incluídas suas autarquias e fundações, para a manutenção do respectivo regime próprio de previdência social, será de 11% (onze por cento), incidente sobre a totalidade da base de contribuição. O artigo 16, da Lei n. 10.887/2004 registra que as contribuições estabelecidas naquela lei são exigidas a partir de 20 de maio de 2004. Até então, nos termos do seu § 2º, estavam mantidas as contribuições previstas na Lei 9.783/99, para os servidores ativos.

Atentos ao que estabelece o artigo 2º, da Lei 8.911/94 e ao conceito de remuneração trazido no inciso III, do artigo 1º, da Lei 8.852/94, o Legislador trouxe na Lei 10.887/2004, artigo 4º, § 2º, a previsão de incidência da contribuição sobre o valor do cargo em comissão recebido na remuneração do servidor ocupante de cargo efetivo para efeito de percepção do benefício. Essa mesma lei, trouxe no seu artigo 10, a nova redação ao artigo 1º, X, da Lei 9.717/98: X - vedação de inclusão nos benefícios, para efeito de percepção destes, de parcelas remuneratórias pagas em decorrência de local de trabalho, de função de confiança ou de cargo em comissão, exceto quando tais parcelas integrarem a remuneração de contribuição do servidor que se aposentar com fundamento no art. 40 da Constituição Federal, respeitado, em qualquer hipótese, o limite previsto no § 2º do citado artigo. A exclusão dessa parcela, da base de cálculo da contribuição, só ocorre nas situações em que a lei disponha expressamente. Seria o caso do servidor que não ocupa cargo efetivo, ou seja, o puramente comissionado, considerando que a lei se refere à contribuição a ser realizada pelo servidor ocupante de cargo efetivo, sobre o total de sua remuneração, ou seja, sobre o total da remuneração do servidor. Uma vez realizada a opção em atividade, que ocorre quando o servidor investido no cargo em comissão/função, passa a receber apenas o percentual legal do valor da vantagem instituída pela lei 8.112/90, que será acrescido na “sua remuneração” na forma prevista no artigo 2º, da Lei 8.911/94, a vantagem automaticamente integra a remuneração de contribuição, por força da disposição legal (Lei 8.852/99, artigo 1º, III) que insere tal vantagem no conceito de remuneração do servidor. Por isso, o pressuposto antecedente ao cálculo do provento, enseja a identificação das parcelas que integram o conceito de remuneração do servidor.

Apontado o amparo na legislação previdenciária [que retrata o conceito da composição de remuneração para efeitos da incidência do tributo previdenciário] relacionando as parcelas que compõe a remuneração do servidor, incluída a vantagem do artigo 62 e quaisquer outras, cabe à Administração proceder a retenção do tributo, até por força do que estabelece a redação do artigo 40, § 3º, da CF/88. Este dispositivo mencionado e, nas sucessivas alterações de sua redação, vem estabelecida a forma de cálculo dos proventos, ou seja, quais parcelas serão adotadas para compor o cálculo do benefício. Na redação da EC 20/98, o dispositivo em questão dispunha que os proventos de aposentadoria, “por ocasião da sua concessão” serão calculados com base na “remuneração do servidor” e, na forma da lei, corresponderão à totalidade da remuneração. Na redação da EC 41/2003, o § 3º, do artigo 40 foi alterado para constar: Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei. Nova redação foi trazida pela EC n. 103/2019, ao § 3º, do artigo 40 da Constituição: As regras para cálculo de proventos de aposentadoria serão disciplinadas em lei do respectivo ente federativo. Aponto, ainda, os §§ 3º e 12 do artigo 40, c/c o § 11, do artigo 201, da CF/88, estabelecem que servem de base de cálculo para as contribuições previdenciárias as remunerações/ganhos habituais, somando-se à imposição legal da incidência da contribuição sobre a vantagem, expressamente prevista no artigo 4º, § 2º, da Lei 10.887/2004 [a mesma trazida no artigo 62, da Lei 8.112/90 e no artigo 2º, da Lei 8.911/94]. Acrescento a previsão no artigo 16-A da Lei 10.887/2004, inserido pela MP 449/2008, posteriormente transformada na Lei n. 11.911/2009, que passou a exigir a contribuição do Plano de Seguridade do Servidor Público, decorrente, inclusive, de valores pagos em cumprimento de decisão judicial. Posteriormente, teve a redação alterada pela MP 497/2010, recepcionada pela lei 12.350/2010. Por seu turno, nova alteração do artigo 4º, da Lei 10.887/2004, [redação dada pela Lei 12.618/2012], prevendo que a contribuição social do servidor público ativo de qualquer dos Poderes da União, incluídas suas autarquias e fundações, para a manutenção do respectivo regime próprio de previdência social, será de 11% (onze por cento), incidentes sobre: I - a totalidade da base de contribuição, em se tratando de servidor que tiver ingressado no serviço público até a data da publicação do ato de instituição do regime de previdência complementar para os servidores públicos federais titulares de cargo efetivo e não tiver optado por aderir a ele. Alinhavo a análise citando a Lei n. 9.717/98, aplicada aos regimes próprios de previdência, que estabelece no seu artigo 1º, X, os critérios do cálculo do para recebimento do benefício de aposentadoria, permitindo expressamente a integração da função de confiança ou do cargo em comissão, quando tais parcelas integrem a remuneração de contribuição do servidor que se aposentar com fundamento no artigo 40, da CF/88, respeitado o limite previsto no §, 2º, do Texto Constitucional, ou seja, respeitada a remuneração do servidor, recebida em atividade, que serviu de base de cálculo para a contribuição previdenciária. Não obstante as legislações que amparam a incorporação, aos proventos da aposentadoria, pertinente apontar a nova redação trazida pela Emenda Constitucional n. 103, que inseriu o § 9º, no artigo 39 da Constituição Federal, para impedir, a partir de sua publicação (13.11.2019) a incorporação da vantagem vinculada ao cargo em comissão, na remuneração do cargo efetivo. Essa previsão constitucional veio vedar eventual legislação que restaure a incorporação da vantagem “na remuneração do cargo efetivo. Nada dispõe sobre vedar a incorporação da vantagem ao provento, nos termos expressos no artigo 40, § 3º, da CF/88, onde determina que no cálculo dos proventos serão consideradas as parcelas que compuseram a base de cálculo do tributo previdenciário em atividade. Aliás, a incorporação dessas vantagens no provento está prevista expressamente no § 2º, do artigo 49, da Lei 8.112/90 e no artigo 11, da Lei 8.911/94.

Ato da Administração Pública Federal que tenha excluído o valor da vantagem do artigo 62, da Lei 8.112/90 [valores indicados nos §§ 1º e 2º, da Lei 8.911/94] da base de cálculo da contribuição previdenciária, caracteriza violação às legislações mencionadas e, ao comando constitucional inserido no artigo 40, § 3º, da CF. A omissão, se constatada, não resulta em prejuízo ao servidor, mas compete ao gestor, aplicar o procedimento estabelecido na Lei 10.887/2004, artigo, 8º-A e seus parágrafos, ou seja, proceder à cobrança do período respectivo, sobre a o valor da função recebida em atividade, à época do período omitido, parcelando o débito em valor máximo de 10% da remuneração do servidor. Esse procedimento não prejudica a incorporação da vantagem prevista na forma prevista lei e, tampouco acarreta a ilegalidade do ato que concedeu a aposentadoria nos exatos termos estabelecidos na lei.

Vantagem Paga pelo Exercício do Cargo em Comissão: Incorporação nos Proventos

Os casos e condições em que a “vantagem” prevista no caput do artigo 62, da Lei 8.112/90, incorporava à remuneração, eram tratados no § 2º, do artigo 62, do Estatuto do servidor e foi extinta em 1.998, pela Lei 9.624, que revogou os artigos 3º e 10 da Lei 8.911/94 [Tema 395 da repercussão geral no RE 638.115].
Mas a vantagem paga pelo exercício do cargo em comissão/função, existente na atividade, tem natureza jurídica remuneratória [Lei 8.112/90, artigo 41, § 1º]. Prevista no artigo 62 e 9º, do Regime Jurídico dos Servidores Publicos Civis da União. O artigo 62 está inserido na Seção II, do Capítulo II, dentro do Título III, que dispõe sobre “os direitos e vantagens” do servidor. Apresenta o instituto denominado “vantagem” como gênero da espécie denominada “retribuição/gratificação”, paga pelo exercício do cargo em comissão/função/assessoramento/natureza especial. No artigo 49, caput, denomina a vantagem de gratificação/retribuição e, no § 2º, deste artigo, estabelece que as gratificações/retribuições se incorporam aos “proventos” nos “casos” e “condições” indicados na lei, nos termos expressos e claros no § 2º, do artigo 49, da Lei 8.112/90.

Por sua vez, a Lei n. 8.911/94 traz no enunciado de sua ementa, que ela (a lei) dispõe sobre a remuneração dos cargos em comissão, define critérios de incorporação de vantagens (no plural) de que trata a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990. No seu artigo 11, estabelece que a vantagem tratada naquela lei integra os proventos de aposentadoria e pensões. No seu artigo 2º, estabelece o direito de opção a ser exercido pelo servidor, em atividade, quando investido no cargo em comissão/função, optar por receber os vencimentos do seu cargo, acrescido de um percentual do valor fixado como vantagem do artigo 62, da Lei 8.112/90. Realizada essa opção, na atividade, o servidor preenche a condição prevista na lei, para ver o valor dessa vantagem incorporado aos proventos de sua aposentadoria, conforme previsão expressa no seu artigo 11. É o artigo 41, § 1º, da Lei 8.112/90 que estabelece que a remuneração do cargo em comissão será paga na forma do artigo 62, ou seja, na forma de uma vantagem denominada gratificação retribuição [sinônimos].

A vantagem, denominada de gratificação/retribuição, prevista no artigo 62, da Lei 8.112/90, recebida em atividade, pelo exercício do cargo em comissão/gratificação, integra a remuneração do servidor, quando realizada a opção estabelecida no artigo 2º, da Lei 8.911/94 e, integra os proventos de aposentadoria do servidor, nos termos do seu artigo 11, c/c o artigo 49, § 2º, da Lei 8.112/90, até porque a vantagem recebida em atividade integra a base de cálculo da contribuição previdenciária.
As “condições” a que se refere o § 2º, do artigo 49, da Lei 8.112/90, para a incorporação de gratificação nos proventos, decorre de previsão legal, qual seja: o servidor, investido no cargo em comissão/gratificação, que realiza a opção do artigo 2º, da Lei 8.911/94 e permanece no exercício desse cargo até completar os requisitos para a aquisição do benefício previdenciário. A necessidade de estar no exercício do cargo em comissão na data do implemento dos requisitos da aposentadoria, decorre do próprio cálculo do benefício, que é realizado sobre a remuneração recebida em atividade (a base de cálculo para a os proventos é a última remuneração do servidor, não estando no exercício do cargo, a vantagem não mais integrará a sua remuneração, na data do implemento dos requisitos do benefício, não podendo ser computada, por força do artigo 40, § 2º, da CF/88)

Em relação ao instituto trazido no artigo 193 da Lei 8.112/90, de natureza jurídica previdenciária, vigeu até 12.12.1997, quando revogado pela Lei 9.527/97 e, com aquela vantagem do artigo 2º, da Lei 8.911/94, não se confunde.

Trazido na Lei 8.112/90, no Título VI que trata da Previdência Social do Servidor. O Capítulo II, deste Título, traz os Benefícios e na sua seção I, trata da aposentadoria, onde veio inserido o artigo 193. É, pois, um benefício previdenciário adquirido pelo exercício da função do cargo em comissão/função de confiança pelo implemento do requisito temporal estabelecido no artigo 193, durante a sua vigência. O único requisito estabelecido para a aquisição do direito ao benefício do artigo 193 (direito de opção quando da passagem para a inatividade) estava estabelecido no caput, daquele artigo: “O servidor que tiver exercido função de direção, chefia, assessoramento, assistência ou cargo em comissão, por período de 5 (cinco) anos consecutivos, ou 10 (dez) anos interpolados, poderá aposentar-se com a gratificação da função ou remuneração do cargo em comissão, de maior valor, desde que exercido por um período mínimo de 2 (dois) anos.”

O verbo é colocado no passado (tiver) quando se refere ao exercício do cargo. Mas remete ao futuro (poderá aposentar-se) ao fixar o momento em que seria exercida a opção). Na redação do caput, o dispositivo impunha uma condição “temporal”, expressamente prevista naquele artigo, que deveria restar preenchida no passado, quando no exercício do cargo em comissão. Preenchida a condição temporal, na vigência do artigo 193, o ato jurídico estava aperfeiçoado e, o direito de exercer a opção, quando da aposentadoria passava a integrar o patrimônio jurídico do servidor. O exercício desse direito de opção, tem fundamento no artigo 49, § 2º, porque a condição a que ele faz remissão, e que estava prevista no artigo 193, foi preenchida à época da vigência do dispositivo. É a regra trazida na Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, artigo 6º, aplicada no Direito Administrativo. A negativa do exercício do direito adquirido, viola o artigo 5º, XXXVI da CF/88, nos termos da Súmula 359, do STF e, o artigo 49, § 2º. A Lei 9.624/98, prevê o reajuste do valor incorporado aos proventos, em seu artigo 8º, restando ilegal a determinação do TCU para que transformando em VPNI, o valor incorporado há mais de cinco anos, até a sua supressão por reajustes posteriores, ou, ainda, suprima aqueles incorporados a menos de 5 anos.

Conclusão

A decisão proferida no Acórdão TC n. 565/2021, em decorrência das inconstitucionalidades/ilegalidades apontadas, é passível de ação perante a Suprema Corte, postulando a sua nulidade. A vantagem do artigo 62, da Lei 8.112/90, que serve de base de cálculo para a incidência do tributo, integra os proventos da aposentadoria, nos casos e condições traçados nas linhas desta análise. O benefício previdenciário estabelecido no artigo 193, da Lei 8.112/90, para o servidor que completou o interstício temporal nele estabelecido, durante a sua vigência, é devido, por força do artigo 6º, da LINDB, 5º XXXVI, da CF/88. A vantagem do artigo 2º, da Lei 8.911/94 incorpora aos proventos de aposentadoria. Os órgãos da Administração Pública não estão obrigados à observância da Jurisprudência do Tribunal de Contas, diante da ausência de previsão constitucional/legal que os submeta. O Administrador que põe em prática o cumprimento de ordem ilegal, incorre igualmente na ilegalidade perpetrada por ato não vinculativo, em decorrência de sua autonomia administrativa. A competência para apreciar o ato inconstitucional, perpetrado no acórdão do TCU, é do Supremo Tribunal Federal, mas não afasta a competência dos demais órgãos do Poder Judiciário para apreciar a matéria de direito controvertida, no que diz respeito à incorporação das vantagens mencionadas, no provento de aposentadoria.